Archive for September 2017

Capítulo 39



As ondas do mar desembocavam lentamente na praia. No entanto, as coisas pareciam levemente fora do comum na Cidade de Olivine. Lá embaixo, na costa, Ethan, Amy e Forrest davam seus primeiros passos dentro do território da Cidade. Após reservarem um quarto e guardarem suas coisas, o grupo desceu para a praia. [...]

Flaaffy parou por um instante e encarou o farol da cidade. Ela começou a sentir um aperto no coração. [...]

A tarde passou de forma tranquila na Cidade de Olivine. O grupo só retornou para o Centro Pokémon quando a lua já tomava seu lugar no céu.  [...]

Em seu quarto, o grupo começou a ouvir as gotas da chuva lá fora. Raios e trovões chegavam cada vez mais fortes, mas os garotos não pareciam estar preocupados. Eles tinham comida quentinha no refeitório e lençóis cheirosos no dormitório. Estava tudo bem, não era necessário sentir preocupação.

Após um bom banho, Amy vestiu sua camisola e dirigiu-se até a varanda do Centro Pokémon. A chuva já havia cessado, mas a cidade ainda estava encharcada. Olhando para o horizonte, a garota percebeu que havia uma fraca luz que girava devagar. O Farol Cintilante não estava mais nos seus melhores dias. [...]

***

— Ethan, por favor, compareça à recepção. Ethan, por favor, compareça à recepção. — Soava a voz da Enfermeira Joy pelos alto-falantes do Centro Pokémon.

O garoto saiu correndo do refeitório segurando alguns pãezinhos. Com a boca cheia, alcançou em tempo recorde o balcão da enfermaria.

— Ethan, eu mesmo, presente! — Exclamou o garoto.
— Seus Pokémon estão totalmente recuperados. — Disse a Enfermeira sorridente, entregando uma bandeja com as seis PokéBolas do garoto.
— Obrigado! — Agradeceu Ethan com um sorriso sincero.

Amy e Forrest apareceram em seguida, espreguiçando-se.

— Essa pressa toda apenas pra lutar no Ginásio? Achei que você estivesse nervoso. — Comentou o moreno.
— Acordei bem disposto hoje. — Respondeu Ethan.

A Enfermeira Joy se dirigiu aos garotos.

— Vocês vão desafiar o Ginásio de Olivine? Porque ele não se encontra disponível no momento. — Disse a mulher.

Ethan encarou a enfermeira com uma expressão incrédula.

— Quê? Mas como assim?!
— O Pokémon da Líder que vive no Farol Cintilante está doente.

Os três se encararam.

— O farol do porto? Por isso que ele estava emitindo uma luz meio fraca ontem? — Perguntou Amy.
— Sim. Não só ontem, mas todos os dias desde que o Amphy ficou doente... E isso já tem um mês. Até mesmo a frota de navios do Porto de Olivine sofreu uma queda drástica, porque é perigoso chegar a noite com a luz de Amphy sendo emitida fracamente dessa maneira. — Explicou Joy.
— Mas você não conseguiu tratar o Amphy? — Questionou Forrest.
— Eu não consegui... Não tenho um tratamento super-efetivo para o câncer do Amphy... — Respondeu Joy em uma expressão triste.

Amy, Ethan e Forrest engoliram em seco.

— Câncer? — Aquela palavra arrebentou o coração de todos.
— Sim... A idade avançada do Amphy acabou diminuindo a imunidade do corpo dele e a doença atacou mais rápido. — Disse Joy.
— Bem, vamos até o Farol Cintilante. Se a Líder do Ginásio está lá, talvez nós possamos ajudar o Amphy de alguma maneira. [...] — Sugeriu Ethan.

Os outros dois pareceram concordar.

***

O farol era enorme. Tinha uns vinte metros de altura ou mais. Ethan, Amy e Forrest admiraram a arquitetura antes de adentrar o local. [...]

Amphy estava no último andar. Continuava deitado, com a respiração pesada. Ethan sacou a PokéAgenda.

“Ampharos, um Pokémon Luz. É a forma evoluída de Flaaffy. A ponta da cauda brilha e pode ser visto de longe. Ele atua como um farol para as pessoas perdidas. É considerado valioso desde a antiguidade por ser um pequeno farol.” — Informou a PokéAgenda.
— Forma evoluída do Flaaffy...? — Ethan guardou o dispositivo eletrônico e pegou sua PokéBola, liberando seu Pokémon.

Flaaffy encarou seu treinador com um sorriso e começou a percorrer aquele local estranho com o olhar.

Quando o Pokémon de Ethan encarou Amphy em seu estado terminal, um frio repentino tomou conta de seu estômago. O coração disparou. Sua respiração ficou mais pesada e profunda. Flaaffy estava estática.

Jasmine soltou uma exclamação.

— Oh! Você tem um Flaaffy! Que esplêndido! — Jasmine aproximou-se depressa da criatura.
— É uma menina. Faz um tempo que estamos juntos. — Disse Ethan, orgulhoso.
— Agora eu tenho duas coisas pra pedir pra você. — Jasmine olhou para Ethan com uma feição séria.
— Duas? — Perguntou Ethan com uma clara feição de dúvida.

Jasmine se levantou.

— A primeira é que preciso que vocês vão até a farmácia de Cianwood. Tem um remédio lá que foi feito sob medida para curar o Amphy... Eu não posso ir e deixar ele sozinho... — Disse a moça.

Ethan concordou.

[...] — A segunda coisa... É deixar sua Flaaffy aqui comigo. — Jasmine pareceu ter cuidado com as palavras.

Ethan a encarou com certa ironia.

— Tá doida, mulher? Por que eu deixaria meu Pokémon aqui com você? Eu mal te conheço!

Jasmine sorriu.

— Bem... Eu administro o farol e o Amphy está doente... Como Flaaffy pode fazer luz com a ponta de sua cauda assim como o Amphy, é perfeita pro trabalho. Vamos, garoto, por favor... Eu pago a estadia em Cianwood, o transporte, tudo... Só me deixe pegar Flaaffy emprestado. — Disse a garota quase implorando.

Ethan recuou um passo e fechou os punhos.

— Mas é o meu Pokémon...

Amy aproximou-se do rapaz, apertando seu ombro direito.

— Ethan, deixa a Flaaffy aqui. Eu sei que é difícil, mas... É por um bem maior. Vai ser algo rápido, só enquanto vamos buscar o remédio.

Forrest se aproximou.

— Ela tem razão, Ethan.

Ethan afrouxou os punhos.

— Cuide bem dela... — E deu um profundo suspiro.

Jasmine sorriu de orelha a orelha.

— Muito obrigada! Ela será bem cuidada! — Exclamou a Líder de Ginásio.

***

Com alguns telefonemas, Jasmine reservou três passagens de navio para os garotos. Eles embarcariam no S.S. Aqua, um navio de luxo que sairia do Porto de Olivine. Eles seguiriam de graça para Cianwood e voltariam para Olivine, tudo por conta. A despedida foi rápida, visto que Jasmine teve de voltar correndo para o Farol Cintilante para cuidar de Amphy e Flaaffy foi em seu encalço, olhando para trás de vez em quando para ver o navio com seu Mestre indo embora.

Assim que voltaram para o Farol Cintilante, Jasmine explicou para Flaaffy como aquela imensa construção funcionava. Cada canto, cada andar tinha uma história e um significado. Cada tijolo e degrau tinha uma função, uma razão de existir. A pequena Flaaffy começou a admirar aquele lugar. Não era mais em função de Ampharos. Ela se sentia conectada com aquele ambiente. Sentia que fazia parte, que aquele lugar pertencia a ela.

Quando voltaram ao topo da torre, Flaaffy voltou a encarar Amphy. O Pokémon continuava com a respiração pesada, mas dormia profundamente. Com receio de se aproximar, Flaaffy permaneceu estática no meio da sala enquanto Jasmine aproximava-se de seu Pokémon para aplicar uma das dezenas de dosagens dos remédios que Ampharos tinha que tomar. A jovem agachou-se em seu lugar de costume e acordou Amphy, lentamente. Jasmine estendeu uma das cápsulas de remédio para o Pokémon que virava o rosto. Era uma das horas mais difíceis do dia, pois ele não queria tomar seus remédios. Por mais que sua treinadora insistisse e implorasse, Ampharos se recusava com todas as forças. Ela só tinha sucesso quando ele desistia por exaustão.

Naquele dia, no entanto, Flaaffy não aguentou ver os dois sofrerem. Aproximou-se de Amphy com cuidado e acariciou sua cabeça. Ampharos a olhou e, por um segundo, sua respiração parou. Seu coração disparou. Ele não sabia quem era ela, mas desejou que não fosse imaginação.

Flaaffy lhe pediu. Amphy então olhou para Jasmine e se permitiu tomar aquelas cápsulas que o deixava com gosto ruim na boca. Mas não reclamou. Sua treinadora se surpreendeu.

— Ele nunca fez isso antes...! — Exclamou assustada.

Flaaffy sorriu para Amphy. Gentilmente, cobriu seu corpo com a manta amarela que ele tanto gostava e ele relaxou.

Jasmine sorriu.

— Acho que você foi a melhor coisa que já aconteceu em muito tempo. — E acariciou os pelos macios de lã da cabeça do Pokémon.

A jovem pegou um PokéGear do bolso do casaquinho branco e olhou as horas.

— Seis e meia...! Flaaffy, preciso lhe mostrar a iluminar o farol antes de anoitecer de vez!

Jasmine levantou apressada e se dirigiu para uma grande máquina que ficava atrás da cama de Amphy. Era imensa. Era um enorme cilindro de vidro cercado por computadores de última geração. Dentro, uma confortável cama cheia de almofadas de algodão com um espelho no teto.

— Flaaffy, você só tem que deitar aqui e acender a luz na ponta da sua cauda. O reflexo deste espelho irá fazer com que a luz se propague e se refreie, permitindo que ela brilhe no topo do farol. Fácil, não é? — Sorriu Jasmine. — Vamos tentar! Por favor, venha. Deite-se aqui.

Flaaffy, sem entender nada, apenas seguiu o que a garota havia lhe instruído. Deitou-se na confortável cama e acendeu sua luz. Jasmine deu alguns comandos ao computador e a máquina começou a funcionar. A parte de cima do cilindro de vidro começou a girar em sentido horário. A luz iluminava o espelho, passando por ele e atingia um teto de vidro dentro do grande cilindro, fazendo-a brilhar intensamente. Lá fora, os moradores de Olivine olharam encantados: Depois de muito tempo, o farol estava funcionando novamente.

E assim, os dias passaram-se. A rotina sempre se repetia: De manhã, Ampharos tomava seus remédios junto com a ração matinal. À tarde, ele se exercitava em esteiras, comia sua ração e, outra vez, tomava seus remédios. À noite, outra dose de remédio, ração de jantar e uma boa noite de sono. Tudo começou a ficar melhor quando Flaaffy começou a ajudar, pois Amphy passou a ficar mais motivado a fazer as coisas. A ligação entre os dois Pokémon a cada dia ficava mais forte. A cada minuto, os dois ficavam mais próximos e Jasmine sorria. Ela sabia o quanto era importante aquilo para Amphy e incentivava mais do que ninguém o relacionamento dos dois.

***

O apito do S.S. Aqua soava. A cidade de Olivine aproxima-se. O sol da tarde estava a pino e o céu limpo saudava novamente o navio.

Ethan mudou sua expressão.

— Olivine... Finalmente voltamos. Vou pegar a Flaaffy de volta e junto dela, minha sexta insígnia. — Disse o garoto sério.

Amy e Forrest se entreolharam. A garota dirigiu-se até a janela.

— Espero que com esse remédio, Amphy fique bem. — Suspirou preocupada.

Em vinte minutos, o navio atracou no porto. Após o desembarque, os três seguiram para o Centro Pokémon para procurar vagas em algum quarto e recuperar a energia de seus Pokémon. A euforia da primeira vez já não estava mais na cabeça dos garotos, a preocupação com Amphy era maior do que tudo. O trio fez o check-in, desceu as escadas, cruzaram a recepção e se dirigiram para a enfermaria. Ethan deixou seus Pokémon sob os cuidados de Chansey e Joy e, lentamente, dirigiu-se com os amigos à orla da praia da cidade. Estava quente. O céu azul convidava humanos e Pokémon a brincarem na areia branca e a nadarem na água fria e refrescante do mar. Aqueles três pareciam tão preocupados, e seu semblante sério parecia tão fora da realidade, que não foi muito difícil chamarem a atenção das pessoas por quem passavam. Logo, o farol se aproximava e tornava-se imponente na frente do trio.

Ana, a secretária de Jasmine, nem precisou partir para a burocracia. Assim que os garotos chegaram na recepção do farol, ela logo foi conduzindo-os para o elevador que os levaria até o encontro da Líder do Ginásio. Os segundos que se passaram na corrida do elevador para chegar até o topo da torre do farol, onde estava Amphy, pareceram uma eternidade. A ansiedade do trio estava estampada em suas faces e nas gotas de suor em suas mãos. Tensão. Pensamentos rápidos. Todos os sintomas de uma preocupação constante.

Um pouco do alívio só veio quando as portas do elevador se abriram e o grupo teve a visão panorâmica da praia de Olivine em sua frente, pela janela. 

Flaaffy, assim que viu Ethan passar pela porta, correu em direção ao garoto e pulou em seu colo. O Pokémon lambia seu rosto com intensidade, procurando sentir o cheiro e o gosto de seu treinador. Apesar do curto período de tempo, a forma com que eles tiveram que se separar foi rápida e dolorida para ambos, que mal tiveram chance de dizer "tchau". Mas aquele momento era como se às coisas passassem devagar. Como se o próprio planeta girasse mais devagar para que os dois pudessem se redimir como se nada mais pudesse atrapalhar aquele momento.

— Que saudade que eu tava de você! — Exclamou Ethan. — Você nem imagina a falta que me fez!

Jasmine aproximou-se dos dois com um sorriso. Seu semblante cansado, as olheiras profundas e até mesmo o cabelo meio desarrumado não deixaram ou impediram a jovem de esconder a felicidade de ver o trio.

— Que felicidade em ter vocês de volta! E parece que não sou a única a achar isso.
— Que bom te ver também, Jasmine! Como estão as coisas aí? — Perguntou Forrest.
— Tudo ótimo! Vocês nem imaginam o quanto a Flaaffy foi útil. 
— E o Amphy, como está? — Quis saber Amy com um leve tom de preocupação na voz.
— A evolução dele foi incrível! Ele está se esforçando mais, está tomando todos os remédios certinhos... Estou muito feliz com isso!

O trio sorriu aliviado. Ethan colocou Flaaffy no chão e pegou a mochila. Procurou dentro dela e encontrou o remédio trazido de Cianwood. Entregou para Jasmine e ela se apressou em dosa-lo para Amphy. O Pokémon ingeriu as pálidas cápsulas de medicamento, deu um cheiro de carinho em sua treinadora e deitou em sua cama acolchoada para descansar. Flaaffy aproximou-se e cobriu Amphy com a manta amarela e recebeu um olhar terno de carinho de resposta.

Ethan, Amy, Forrest e Jasmine deixaram o local e desceram para a recepção do Farol. Aliviados, o semblante dos quatro estava mais suavizado. Afinal, o remédio era a grande esperança de melhora de Ampharos.

— Muito obrigado pela viagem de vocês. Fico grata por todo o esforço em ir buscar o remédio para o Amphy... Eu não sei o que faria se vocês não tivessem aparecido. — Disse Jasmine, sorrindo.
— O prazer foi todo nosso. É um alivio saber que agora ele pode ficar melhor de vez. — Comentou Forrest.
— A gente ficou a viagem toda pensando em voltar logo pra Olivine e poder entregar esse remédio... Que bom que conseguimos. — Suspirou Amy, aliviada.
— A propósito, Ethan. Eu não me esqueci da nossa batalha de Ginásio. — Disse Jasmine sorrindo para o garoto.
— Ah, não se preocupe com isso. Enquanto estávamos em Cianwood, eu peguei a Insígnia local. Claro que mal vejo a hora de lutar contra você, mas eu acho que é melhor você se preocupar com o Amphy, né?
— Não se preocupe. Lutar contra você é o mínimo que eu posso fazer. Por favor, compareça ao Ginásio de Olivine amanhã pela manhã, tudo bem? Vamos realizar essa batalha e ver do que você é capaz.

Ethan hesitou por um segundo.

— Mas... Tudo bem mesmo?
— Tudo sim. Descanse e me procure amanhã. — Sorriu Jasmine.

O garoto sorriu de volta e, após alguns instantes, despediu-se da jovem e se retirou do local com Amy e Forrest.

Já começava a anoitecer quando o trio chegou ao Centro Pokémon. Ethan pegou seus Pokémon, recuperados, e subiu para a suíte onde ele passaria a noite com os amigos. As janelas do quarto estavam abertas e uma cortina de vento gélido entrou, fazendo-os ter um arrepio. Forrest aproximou-se e as fechou, e ali ficou um tempo, admirando a praia, que tinha de efeito a luz do Farol Cintilante brilhando forte, graças à Flaaffy. As horas foram passando e, aos poucos, Olivine foi ficando mais calma. Os moradores, humanos e Pokémon, aos poucos foram deitando em suas camas e dormiram. Na suíte, Amy e Forrest dormiam serenamente. Ethan, no entanto, não conseguia piscar o olho. Seja pelo nervosismo da batalha que teria dali a algumas horas, seja pela preocupação com Amphy, o fato era que a insônia do garoto o incomodava.

O garoto levantou da cama e, mesmo de pijamas — um shorts azul e uma camiseta branca furada embaixo da axila —, calçou seus tênis gastos, colocou suas PokéBolas no bolso e se retirou do quarto. Ele nem ao menos fez questão de pegar seu boné. Desceu a recepção, cumprimentou a Enfermeira Joy, e saiu pela porta automática. De frente ao Centro Pokémon, havia uma praça. O garoto se sentou sozinho e deixou a brisa litorânea tocar o seu rosto. Permitiu-se cair em pensamentos.

Vez em quando, Ethan olhava para o Farol Cintilante. A luz que guiava o porto da cidade brilhava intensamente. Aquecia seu coração saber que Flaaffy auxiliava Jasmine e Amphy tão bem e, ao mesmo tempo, a dúvida da permanência dela em sua equipe de Pokémon martelava sua cabeça. Do momento em que retornou, o garoto percebeu que Flaaffy fazia a diferença ali. E que mesmo que ela voltasse a fazer parte da equipe, com certeza o seu coração ficaria sempre em Olivine.

Essa era com certeza mais uma das dúvidas que pesavam toneladas dentro da cabeça do jovem.

A madrugada avançava noite adentro e o sono de Ethan não vinha. Foi quando uma presença feminina aproximou-se dele.

— Que surpresa te encontrar aqui essas horas. — A doce voz de Jasmine fez Ethan despertar de seus devaneios em um susto.
— Jasmine! O que faz por aqui?! — Perguntou ele surpreso.
— Eu geralmente venho esse horário atualizar a dose de medicamentos do Amphy com a Enfermeira Joy. Como o dia é bastante corrido, o único horário que eu tenho pra tratar disso é só agora, quatro da manhã.
— Você não dorme?! — Perguntou o garoto assustado.

Jasmine riu.

— Faz muito tempo que eu não sei o que é uma boa noite de sono. Desde que o Amphy ficou doente e seu estado de saúde se agravou, eu não paro mais pra dormir mais que duas, três horas. Eu preciso ficar sempre atenta pra cuidar dele.

Ethan engasgou.

— Desse jeito, quem vai ficar doente é você...
— Não se preocupe, eu estou bem. Eu vou ficar bem.

Ethan convidou Jasmine para sentar-se ao seu lado. A jovem agradeceu com um sorriso e ajeitou-se ao lado do garoto. Ficou algum tempo em silêncio, vendo as ondas do mar desembocarem na praia e enchendo os pulmões com o ar que soprava ali. O garoto olhava Jasmine em silêncio. Mesmo pela expressão exausta, mesmo pelas grandes olheiras, ela era muito bonita.

Ele respirou fundo e encarou o oceano.

Minutos em silêncio se passaram. Nenhum dos dois falava absolutamente nada, apenas encaravam a noite estrelada e a areia branca. A lua minguante era a única coisa que disputava a atenção dos dois junto ao farol. O brilho dela e a luz de Flaaffy tinham suas belezas únicas, mas entravam em um contraste indescritível.

Foi Jasmine quem quebrou o silêncio.

— Esse é o meu lugar favorito da cidade inteira. É aqui que eu venho meditar também. E eu fico olhando o céu, o mar, o farol e me perguntando o motivo do Amphy não poder mais sentir essa brisa, olhar essas estrelas. Ele não fez nada pra merecer essa droga de doença.

Ethan observava Jasmine atônito.

— Eu não acho que alguém mereça ficar doente... Acho que as coisas acontecem pra deixar a gente mais forte. E por mais que a gente nunca esteja preparado pra essas coisas, devemos lidar com essas adversidades. Assim a gente pode se tornar mais forte.

Lágrimas começaram a escorrer dos olhos de Jasmine. Ela começou a chorar copiosamente. Ela levou suas mãos ao rosto e Ethan paralisou. Ele não sabia o que fazer para consolá-la.

— Me desculpa... Eu só... não queria... que o meu... Amphy... morresse...

Ethan demorou alguns segundos para colocar uma das mãos no ombro da jovem. E o apertou. E a cada vez que seu coração pesava, ele colocava mais pressão no ombro de Jasmine. E ele não aguentou e colocou para fora, sob lágrimas, toda aquela angústia que guardara desde o primeiro momento em que soube que Amphy estava doente. E chorou também.

— Ele não vai morrer. É muito triste pensar nessa possibilidade... Não tem como, não!

O celular de Jasmine tocou. No identificador de chamadas, o nome de Ana.

— Pronto. — Atendeu Jasmine com a voz embargada.
— Jasmine, é o Amphy... — Disse a secretária em um tom de voz preocupado.

Ethan e Jasmine saíram em disparada em direção ao Farol Cintilante. Atravessaram a orla da praia da cidade com o vento frio cortando o suor do calor dos corpos da dupla que corria desenfreadamente para a imensa construção vertical. Sem fazer nenhum tipo de cerimônia, os dois entraram pelas portas da recepção e Ana, vestida com um robe azul por cima do pijama amarelo, já estava com o elevador preparado. Os três embarcaram e subiram para o último andar, onde ficavam os mecanismos do farol.

Ampharos ardia em febre. Sua respiração estava pesada. Tendo que manter o farol aceso, Flaaffy observava preocupada o estado de saúde de Amphy se agravar aos poucos.

Jasmine correu até Amphy para socorrê-lo. Pediu auxílio de Ethan e Ana, que ficaram atentos a todas as ordens que fossem receber. O garoto tremia da cabeça aos pés de nervosismo. A secretária suava frio.

A jovem abria os armários, pegava lenços, bacias e remédios e colocava tudo ao lado do Pokémon. Olhava para Ethan e Ana e pedia para que eles enchessem as bacias com água quente.

Enquanto Ana enchia a bacia, Ethan sacava a PokéBola de Quilava.

— Lava, preciso da sua ajuda, Por favor, aqueça a água dos baldes com suas chamas!

O Pokémon do garoto acendeu as chamas em seu dorso e posicionou-se ao lado dos baldes que Ana enchia. Enquanto Jasmine aplicava as doses de remédio, ela também encharcava com água morna panos de algodão e colocava na testa de Ampharos, na tentativa de fazer sua febre baixar. Mas Amphy tirava todos e se recusava a tomar os remédios.

Flaaffy parou de produzir luz e correu até o lado de Ampharos para fazê-lo mudar de ideia. Ela discutia com ele que balançava a cabeça negativamente. O ambiente estava muito tenso. Ethan e Ana assistiam atônitos aquela cena lamentável.

“Você não pode fazer isso comigo!”, bradava Flaaffy. “Eu preciso. Estou cansado... Eu preciso ir...”, respondia Amphy.
“Eu não vou saber viver sem você! Eu te amo!”
Palavras que confortaram o fraco coração de Amphy.

“Eu também amo você. Cuide de minha mestra. Ela é uma excelente treinadora. E você é uma linda e maravilhosa Pokémon.”
“Eu não aceito! Você não pode! Não pode!”. As lágrimas escorriam pelo rosto de Flaaffy.
“Eu preciso, minha querida... Eu vejo uma luz tão forte quanto a do Farol Cintilante, a quem eu dediquei minha vida e minha energia... E ela não pode existir sem mim... Assim como o Farol não existe sem você...”.

Uma lágrima escorreu dos olhos de Amphy. Jasmine se afogava em lágrimas. Ethan e Ana não conseguiram segurar o choro também. Era doído ver aquilo acontecer na frente deles e nada poder ser feito a respeito.

— Por favor, Amphy... Eu preciso... de você... — Soluçava Jasmine em prantos.

Ampharos lambeu o rosto da treinadora como um beijo de adeus. E aquilo partiu o coração dela. Amphy então acendeu a luz de sua cauda pela última vez. E foi um brilho vermelho que cegou a todos por um breve instante. Quando a luz cessou, Amphy já não respirava mais.

Jasmine apoiou-se com os punhos no chão e chorou. Botou pra fora toda a dor que sentia naquele momento. Ela não podia aceitar o fato de que seu companheiro partiu assim, sem deixar ela se preparar.

Flaaffy aproximou-se do corpo de Amphy. Começou a chacoalha-lo devagar, como se quisesse fazê-lo acordar de um cochilo. Ela queria acreditar que ele apenas havia dormido, mas iria acordar com o sorriso de todo dia. Era inaceitável que ele tivesse partido sem se despedir devidamente. E todos os planos que ela havia feito para realizar com ele? Era injusto! E ela o agitava cada vez mais forte. Mas ele não se movia mais.

Ela gritou. Botou pra fora em forma de um grito estridente o peso de seu coração. As lágrimas transformaram-se em um brilho forte. Seu corpo começou a crescer e a se modificar. Ela se tornou maior.

Flaaffy havia evoluído para Ampharos. Ainda que tal feito tenha causado uma enorme surpresa em todos ali presentes, a única coisa que se conseguiu ver antes dos primeiros raios de Sol saírem no horizonte fora Ampharos ajoelhar-se ao lado de Jasmine e chorar com ela a perda de um Pokémon querido, que levou consigo metade do coração das duas.

...

Amy despertou com a porta do quarto sendo aberta. E assustou-se ao ver que era Ethan, de pijamas, entrando na suíte. A menina coçou os olhos e, espreguiçando-se, olhou para o amigo e estranhou a sua expressão cansada, com olheiras marcando seus olhos inchados e vermelhos.

— Onde você estava? Aconteceu alguma coisa...?

Ethan caiu de joelhos no chão do quarto e chorou. Chorou a perda de um Pokémon que ele não conhecia, mas que se sentia tão ligado. Chorou por não ter feito nada para fazê-lo melhorar. Chorou porque sabia que nunca mais ele iria se perdoar por ter deixado Amphy morrer.

***

No pé do Farol Cintilante, Ethan, Amy, Forrest, Jasmine, Ana, Ampharos e muitos cidadãos da Cidade de Olivine olhavam para o caixão branco onde jazia o corpo de Amphy. Um silêncio absoluto tomava conta do ambiente. Parecia até mesmo que o mar, em sinal de respeito, chorava com o barulho de suas águas que tocava a areia da praia e levava para longe toda a dor que prevalecia ali. Uma flor havia sido colocada sobre a tampa do caixão. Jasmim, a flor favorita de Amphy. Como o nome da Mestra escudeira e que cuidou dele até o fim de sua vida.

Era por volta do meio-dia quando o caixão desceu para o buraco cavado embaixo do Farol. Amphy foi enterrado onde havia passado sua vida: Na praia, ao lado do lugar em que amava estar, o Farol, onde guiava as vidas que vinham e que passavam, que coletaram e que trouxeram memórias que influenciaram, de uma forma ou de outra, todos os ventos litorâneos da cidade. Ele estava feliz.

Ethan tocou no ombro dos amigos.

— Vamos pessoal. Nossa estadia em Olivine se encerra por aqui.

Amy e Forrest se entreolharam. Jasmine, que estava próxima ao jazigo onde Amphy havia acabado de ser enterrado se virou e viu Ethan começando a se afastar da orla da praia. O garoto se dirigia para o Centro Pokémon.

Não há palavras que confortem um coração quando o luto paira sobre ele. Por mais que todos nós procuremos a fórmula da eternidade, pessoas queridas acabarão, cedo ou tarde, nos deixando em vida. A despedida sempre é um “até logo”.



TO BE CONTINUED...




- Copyright © 2015 - 2022 Aventuras em Johto - Dento (Willian Teodoro) - Powered by Blogger - Designed by CanasOminous -