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- Capítulo 61
O complexo arquitetônico
onde o Ginásio de Blackthorn era situado era um famoso ponto turístico da
cidade. Além dos habituais treinadores
que desafiavam Clair na tentativa de conseguir a insígnia local, também havia pessoas
que procuravam relaxar nas famosas saunas construídas dentro da popular “Toca
do Dragão”, uma parte do complexo principalmente frequentada por integrantes da
elite da cidade, treinadores de Pokémon Dragão de famílias milenares que
construíram a cidade de Blackthorn e que se orgulhavam de seu status de Dragon
Tamers. Mesmo que houvesse discussões a respeito do que era melhor, se as
saunas de Blackthorn ou as fontes termais de Lavaridge, na região de Hoenn— afinal as duas cidades utilizavam vulcões para
proporcionar tal entretenimento aos visitantes —, sabia-se que no fim das contas, o que valia era o conforto que o
lugar oferecia.
Mas não era apenas de
relaxamento que vivia o treinador Pokémon de Blackthorn. Batalhas Pokémon eram
parte da vida de cada Dragon Tamer que ali morava. E a Toca do Dragão também
era um point conhecido para marcar duelos. Dragões de todos os tipos se
enfrentavam e mediam força e poder em batalhas truculentas. Foi desse grupo de
seletos treinadores que nos últimos anos se destacaram dois dos maiores
representantes de Pokémon do tipo Dragão da região: Lance, o Campeão da Liga
Pokémon e Clair, sua prima, Líder do Ginásio local. Não à toa, dois lutadores
que ostentavam altíssimos números de vitórias quase ininterruptas.
Apesar de não faltar
tópicos para os treinadores da cidade poderem se exibir para quem quer que
fosse, o assunto principal dos últimos dias era um Pokémon poderoso que
apareceu para treinar junto aos dragões da Toca do Dragão e que aparentemente
estaria ostentando um certo status de invencibilidade, o que logo motivou os
frequentadores do local a testar suas habilidades perante aquele Pokémon
incrível. As fofocas, no entanto, indicavam que aquele Pokémon costumava fazer
parte da equipe de um treinador Pokémon que perdeu seu respeito, fazendo a
criatura passar a treinar sozinha. Naquela semana, 17 treinadores tentaram
capturá-lo e todos eles falharam. Frustração de uns, humilhação de outros, mas
sempre um encanto geral.
A Cidade de Blackthorn
nunca esteve tão agitada.
— Você ouviu os boatos, né? Sobre o Pokémon poderoso que está treinando na Toca do Dragão — perguntou Forrest a Ethan.
— Não se fala em outra coisa no Centro Pokémon... Será que eu tenho chance com ele?
— Você só vai saber se for lá.
Os dois amigos se encararam. Da janela do quarto, Ethan observava o
movimento da cidade. Já havia até se acostumado com o fato de os dias não serem
ensolarados em Blackthorn, o céu plúmbeo sumia com a lua e retornava ao
amanhecer, talvez pelo fato de que a cidade ficava entre enormes montanhas que
milhares de anos atrás faziam parte de um enorme vulcão, mas desde que estava
na cidade, Ethan não viu o sol brilhar nem uma única vez.
— Pupitar... — suspirou o garoto.
***
A tarde já caia no horizonte. O céu de tom ciano ia ficando cada vez
mais escuro, sinal de que a noite pedia espaço para ocupar as próximas 12
horas. Ethan e Forrest chegavam na entrada da Toca do Dragão em silêncio, o
primeiro por estar nervoso, o segundo por manter uma concentração afiada,
atento a qualquer movimento das ruas ao redor. O moreno sabia que Ethan havia
sido desafiado por Duster e que, diferente de outras ocasiões, o amigo estava
completamente sem motivações para enfrentar o oponente. Ethan já era um
adolescente que se deixava influenciar pelas emoções, então era evidente que o
medo de colocar tudo a perder com seus Pokémon o impedia de tomar decisões
racionais. Forrest, no entanto, sabia que não podia fazer nada, apenas Ethan
seria capaz de resolver por si só essa situação.
Quando as portas se abriram, um silêncio imediato se fez quando
notaram a presença de Ethan e Forrest. Logo, murmúrios e cochichos tomaram
conta do ambiente. A cada passo que dava, Ethan se sentia cada vez menor,
andava com os ombros encolhidos, querendo enterrar a cabeça no chão. O garoto
parou quando viu Forrest fazer o mesmo.
— Então você veio mesmo — a voz de Duster ecoou sobre o ambiente. —
Vejo que é um rapaz de palavra, apesar de ter vindo com segurança particular.
Ethan ergueu a cabeça e procurou no meio de tantas pessoas o rosto
conhecido do rival. Haviam tantas cabeças que Duster se camuflava bem entre
todas elas.
— Ele não é o meu segurança, ele é meu amigo. E eu não vim por sua
causa, eu vim atrás do meu Pokémon.
Mais murmúrios. Passos foram ouvidos e Duster pediu espaço para que,
finalmente, aparecesse perante Ethan e Forrest.
— “Seu Pokémon”? Ah, sim... Você se refere ao Pokémon que está
treinando aqui. Intrigante... Você apareceu na televisão encarando um exército
de Pokémon no Lago dos Magikarp, agora está aqui, arrependido após ter
abandonado seus Pokémon. Queria que as coisas fossem tão simples de se resolver
quanto você pensa que é...
Ethan e Forrest não responderam, apenas continuaram a observar o treinador.
— Vou contar uma coisa pra vocês. Os Dragon Tamers têm muito orgulho
de seu status porque é necessário muito esforço para consegui-lo. Treinar os Tipos
Dragão não é fácil, é uma tarefa árdua, complexa... Todos nós aqui temos algo
em comum, justamente o orgulho a satisfação de poder dizer que treinamos e
domamos o Tipo de Pokémon mais poderoso que existe.
Forrest não conseguiu se conter.
— E faz o que com esse orgulho e satisfação? Enfia onde?
Duster esboçou um sorriso cínico.
— Pra alguém do seu tipo... Você até que é engraçadinho.
O moreno não gostou do que ouviu.
— Como assim “alguém do meu
tipo”? O que você quer dizer com isso?
Um rugido enorme tomou
conta do ambiente e chamou a atenção de todos os presentes. Era um rugido
grave, forte, que fez o chão tremer por poucos segundos antes de um impacto
maior se dar em seguida. Esse sim trouxe uma onda de choque que desequilibrou
grande parte dos presentes, incluindo Ethan, levando-os a cair de bunda no
chão.
— É ele! O nosso convidado poderoso...
— comentou um dos treinadores do local com admiração.
— Pupitar...? É o Pupitar?
— questionou Ethan para Forrest, que não tirava os olhos de Duster.
— Pelo o que parece, e por
incrível que pareça... Acho que é sim, cara. Vá atrás dele.
— Você não vem junto?
— Confia em mim. Eu tenho
que saber de uma coisa com aquele engomadinho ali.
Ethan assentiu com a cabeça
e levantou-se do chão. Antes de seguir pelo corredor que ficava exatamente ao
fim do imenso salão em que se encontravam no momento, com paredes brancas
repleto de retratos com imagens de Pokémon do tipo Dragão e outros Dragon
Tamers — incluindo várias imagens de Lance e Clair em diferentes momentos da
vida —, sua atenção foi chamada por Duster.
— Onde você pensa que vai?
Eu ainda tenho assuntos a resolver com você.
Forrest sacou uma PokéBola
do bolso da calça.
— Acho que você se enganou.
O assunto que você tem que resolver é comigo.
— Escuta, neguinho, não tenho assunto nenhum pra
resolver contigo.
As palavras ditas por
Duster ecoaram na cabeça de Forrest. As pupilas do garoto se dilataram, o
sangue em suas veias começou a correr mais rápido e seus punhos se fecharam na
mesma velocidade em que seus músculos se contraíam. A fúria tomou conta do
moreno que avançou na direção de Duster, dando-lhe um soco em seu rosto tão
forte que o rapaz caiu de costas no chão.
A impressão de que se tinha
era que tudo acontecia em câmera lenta. As testemunhas assistiam estupefatas à
cena, inclusive Ethan, que furioso, deu meia volta e caminhou com passos
pesados na direção de Duster com os punhos em riste, pronto para executar um
soco.
— ETHAN! — berrou Forrest
para o garoto. — Eu me resolvo com ele. Pupitar. Agora!
Ethan paralisou por alguns
segundos antes de assentir de forma positiva com a cabeça sem tirar os olhos de
Duster. A têmpora do menino pulsava ritmada e o ódio exalava de cada poro de
sua pele. Respirou fundo e correu em disparada na direção do corredor em forma
de cauda de Dragonair que levava até as salas de treinamento. No entanto, seu trajeto
foi interrompido quando alguns treinadores liberaram seus Pokémon em sua
frente.
— Você não tem autorização
para passar daqui — comentou um dos Dragon Tamers.
— Mas é o meu Pokémon que
está ali dentro! — Exclamou Ethan em argumento.
— Você. Não. Passará —
outro treinador afirmou enfaticamente encarando Ethan de forma ameaçadora.
O garoto sentia um frio na
espinha ao se deparar com aqueles Pokémon. Dragonair e Dragonite mostravam
presas, um Gyarados rosnava e também havia um Kingdra que dispararia contra o
menino a qualquer momento. Ethan estava cercado.
— Rhydon, Earthquake! — Bradou a voz de Forrest.
O garoto liberou seu
Pokémon jogando sua PokéBola no ar. Rhydon se materializou e caiu no meio do
salão de entrada, jogando todo seu enorme peso no solo e causando um enorme
terremoto que rachou pisos e paredes, desequilibrando humanos e Pokémon.
Pedaços da estrutura do local começou a quebrar e a cair no meio de todos os
presentes.
— VOCÊ ESTÁ LOUCO? O QUE
PENSA QUE ESTÁ FAZENDO COM NOSSO LOCAL SAGRADO? — berrou Duster.
— Eu vou trazer essa bosta
a baixo — respondeu Forrest numa expressão sádica. Ele estava fora de si.
Enquanto Ethan corria para
cada vez mais para o interior da Toca do Dragão, Duster olhava Forrest
incrédulo. Não era possível que aquele garoto pudesse estar falando sério.
— Eu não posso deixar você
acabar com nosso local de treino... Esse lugar é milenar! A Toca do Dragão faz
parte dessa cidade, eu não vou deixar você ao menos sonhar em destruir mais um
centímetro que seja dessa construção.
— Eu não tô nem aí. Não
tenho nem um pingo de empatia pra um racista nojento que se acha superior aos
outros, mas que não é bom em nada, é só um adolescente filhinho de papai que
quer meter o louco... Vou te dar motivo pra você meter o louco. Rhydon, Earthquake de novo!
— Gabite, Take Down!
— Vou mostrar o porquê dos
Pokémon Dragão serem tão difíceis de se treinar. Dragon Claw!
— Stomp!
As garras de Gabite emanaram
um brilho azul-claro e sua energia aumentava exponencialmente seu tamanho. O
Dragão partiu em direção à Rhydon, que virou-se de costas para o oponente e preparou
um coice poderoso com a parte traseira de suas enormes patas, apoiando-se no
chão com as patas dianteiras. O choque dos dois golpes foi intenso e outra
parte do salão de entrada da Toca do Dragão desmanchou-se como papel. Gabite
fora arremessado para uma das colunas de sustentação do local, trazendo o teto
abaixo, para desespero de Duster. Forrest ostentava um olhar furioso, sua
respiração ofegante e suas veias pulsantes eram resultado de uma adrenalina que
há muito tempo não sentia. Ele só sairia dali quando destruísse seu oponente.
***
Havia um lago dentro de uma
enorme caverna situada abaixo das montanhas de Blackthorn. Em uma ilhota
construída no meio das águas, havia uma construção de madeira, um santuário,
que muitos sabiam da existência, mas muito poucos tinham acesso. O local era
pouco iluminado, com alguns focos de luz por entre as pedras espalhadas por
todos os cantos através das estalactites que decoravam de forma rústica aquele
ambiente. Do lado de fora do santuário, um senhor idoso, calvo, que não tinha
mais do que 1,60m de altura, mantinha as duas mãos para trás e, sem ao menos
piscar, mantinha os olhos fixos na água cristalina e imóvel. Podia-se ver no
fundo do lago estalagmites que encaravam aquele senhor da mesma forma estática
em que eram encarados.
Nem mesmo o som da porta
atrás do velho senhor o demoveu de sua concentração absoluta.
— Algum problema, Mestre? —
questionou a voz feminina.
— Hm... — grunhiu em
resposta. Demorou alguns instantes até que ele concedesse alguma resposta. —
Aproxime-se Clair. O que você vê?
A Líder de Ginásio aproximou-se
com calma e colocou-se ao lado de seu Mestre e encarou com certa curiosidade.
As águas continuavam calmas.
— Eu não vejo nada, senhor.
O velho olhou para Clair em
silêncio e grunhiu mais uma vez em resposta.
— Hm.
O silêncio voltou a tomar
seu lugar habitual. Clair voltou a olhar para a água do lago enquanto o idoso
parecia continuar perdido em pensamentos.
— Hm — resmungou outra vez.
— Se você joga uma pedra na água, ela vai gerar ondas que serão espalhadas por
todos os lados. E quando menos esperar, ela chega até você.
Clair ergueu as duas
sobrancelhas quando reparou que, lentamente, um fio de onda aproximava-se da
ilhota em que ela se encontrava.
— Distúrbio... Alguma coisa
alterou o estado de inércia da água do lago... O que foi?
— Hm. Você não sente? Não é
só a água.
Clair agachou-se e
pressionou a palma da mão no chão do santuário. Seu toque a fez sentir que o
chão tremia levemente, de maneira quase imperceptível.
— Terremoto. Causado por um
Pokémon. Esse tremor parece estar ressonando acima de nós.
— Você foi treinada por
mim, mas devo admitir que sua sensibilidade me surpreende. Está cada dia
melhor.
Clair respondeu curvando-se
perante seu Mestre em agradecimento ao elogio. As ondas suaves iam chegando com
maior freqüência e se chocando com a ilhota.
— Hm. Temos trabalho a
fazer — comentou o idoso.
***
Duster andava cambaleando
pelos corredores da Toca do Dragão, talvez pelo fato de o prédio inteiro ainda
tremer pela batalha que ainda acontecia no salão de entrada. O duelo contra
Forrest havia o levado à exaustão. A salvação do rapaz, no entanto, fora a
interferência dos outros treinadores do local que tomaram a frente e passaram a
enfrentar o poderoso Rhydon de Forrest enquanto Duster se preocupava em ir
atrás de Ethan.
— Esses otários não serão
melhores que eu... Destruir a Toca do Dragão, invadi-la por puro egoísmo...
Aquele moleque não vai domar aquele Pokémon antes de mim!
Um novo rugido chamou a
atenção. Um sorriso de satisfação tomou conta do rosto de Duster, que sacou uma
PokéBola e correu em direção ao som.
Ao entrar no dojô, o
sorriso deu lugar a uma expressão de espanto e encantamento. Finalmente, após
tanto ouvir falar da criatura pelas últimas semanas, o treinador pode ver com
seus próprios olhos aquela lenda, um Pokémon bípede enorme cujo corpo era
protegido por uma armadura robusta esverdeada praticamente impenetrável. Seus
dois pares de dentes pontiagudos causavam arrepio na espinha, qualquer mordida
daquela bocarra estraçalharia imediatamente o que quer que fosse, além de ter
costas e ombros espinhosos.
— Você é um Tyranitar, não é?
Você é a criatura que todos da cidade estão falando, a mais forte que apareceu
em tempos na Toca do Dragão... — Duster estendeu a PokéBola na direção do
Pokémon, que estava de costas para ele. — Por favor, me deixe enfrentá-lo!
— Pra quem se gabava de
oferecer ajuda por ser um treinador forte, você até que durou pouco lutando
conta o Forrest.
Duster surpreendeu-se ao
notar que Ethan estava presente na sala.
— Então você conseguiu encontrar
seu antigo Pokémon... Muito me surpreende.
— Estava conversando com
ele quando você apareceu.
— Que pena que eu
atrapalhei — Duster sorriu de forma debochada. — Mas eu estou louco pra lutar
contra esse Pokémon e quem sabe até adicioná-lo em minha equipe. Com certeza
nós dois seríamos os maiores treinadores de Blackthorn! E como você abandonou
seus Pokémon, logo, eu acredito que ele esteja disponível pra captura...
Duster apertou o botão
central de sua PokéBola e uma forte luz tomou conta do ambiente, materializando
Richard, o Feraligatr do treinador. Tyranitar rosnou ao deparar-se com o
oponente.
— Tyranitar! — gritou Ethan
para o Pokémon sem tirar os olhos de Duster. — Quando eu cometi o erro de
querer me comparar com esse cara, eu não imaginava que estava querendo ser
igual a alguém tão baixo. Fui egoísta em não reconhecer seus valores, quis
fazer como ele, ser um treinador mesquinho que se encontra acima de todos. O
meu perdão não é da boca pra fora, eu reconheço que eu fui um treinador
horrível e você tem todo o direito de não aceitá-lo.
Duster começou a bater
palmas.
— Ora, ora, ora... Belo
discurso. Eu até me emocionaria se não fosse a coisa mais hipócrita que eu já
ouvi na minha vida. Grande treinador você, que descarta seus Pokémon e vem
pedir perdão como se fosse a coisa mais simples do mundo!
— Hm. Ao pecado sempre cabe
a humildade do perdão.
Ethan e Duster olharam para
a porta de entrada do dojô e surpreenderam-se com um senhor já idoso, calvo,
que não tinha mais do que 1,60m de altura e que equilibrava-se com a ajuda de
um longo bastão de madeira com uma PokéBola no topo.
— Mestre?! O que está
fazendo aqui?
— Muito me surpreende você
me fazer essa pergunta. Hm. Se bem me lembro, você estava confrontando esse
garoto.
— Sim, Mestre, é verdade.
Esse garoto e o amigo dele estão destruindo a nossa sagrada Toca do Dragão! Eu
estava confrontando-o, não podia deixar isso acontecer.
O Mestre da Toca do Dragão
olhou para Ethan por alguns segundos antes de se dirigir ao garoto.
— Ei, vovô. Não adianta
dizer que a história não é bem assim, né? O senhor não me conhece, então não
tem porque o senhor acreditar em mim — comentou Ethan de forma séria.
A expressão convencida de
Duster foi substituída por incredulidade.
— Mais respeito com o nosso
Mestre, moleque! — esbravejou o rapaz antes de ser cortado pela serena
expressão do idoso, que o encarou.
— Contenha-se, jovem. Ainda
não lhe cedi a palavra.
Duster engoliu em seco. O
velho homem voltou a encarar Ethan e aproximou-se do menino, o analisando de
cima a baixo antes de repousar os olhos no enorme Tyranitar, que colocou-se de
joelhos para permitir que o idoso acariciasse o topo de sua cabeça.
— Isso, isso. Você é um bom
rapaz, um bom rapaz. Hm — sorria enquanto dava leves tapinhas no cocuruto do
Pokémon, para a surpresa de seu ex-treinador e de Duster. — Você não me
conhece, mas eu ouvi falar sobre você, garoto. Muitas coisas.
Ethan sentiu um frio na
barriga.
— Hm. Eu posso ser um pobre
velho hoje, mas eu já tive a sua idade, sabia? Eram outros tempos. Eu vi
guerras, eu vi ditaduras. Eu vi homens e mulheres beberem da água do poder e se
afogarem. E durante todo esse tempo, eu me esforcei em estudar e treinar os
Pokémon Dragões, não para conquistar poder, mas para honrar os meus
antepassados. Muitos deles deram suas vidas junto aos Pokémon para que hoje
você poaa ter liberdade. Responda-me uma coisa, garoto. O que os Pokémon são
para você? Hm?
Ethan hesitou por um
instante pela pergunta repentina. Pensou por alguns segundos em milhões de
respostas, mas preferiu optar pela mais singela. A única resposta que poderia
vir do seu coração.
— Os Pokémon são meus
amigos.
O Mestre do clã dos Dragões
manteve sua expressão serena, mas não deixou de massagear seu queixo,
refletindo sobre a resposta de Ethan.
— Hm. Muito bem. E o que
ajuda você a vencer batalhas?
— Treinamento, senhor.
Treinar bastante sempre me ajudou a desenvolver novas técnicas para ajudar meus
Pokémon em batalhas.
O velho homem coçou o
queixo novamente e virou-se para Duster.
— Qual é o tipo de
treinador que o senhor procura enfrentar? Hm?
Duster não pestanejou antes
de responder.
— Os mais fortes, Mestre.
Sempre!
A expressão serena do idoso
se mantinha firme enquanto ele massageava o queixo com mais intensidade.
— Hm. Pokémon forte.
Pokémon fraco. Qual dos dois é mais importante?
— Eu sou um Dragon Tamer,
Mestre! Claro que queremos apenas os Pokémon mais fortes ao nosso lado! —
Respondeu Duster, orgulhoso de sua resposta.
O Mestre Dragão segurou de
forma firme seu bastão de madeira. Em silêncio, dirigiu-se a passos lentos até
a porta da sala enquanto parecia perdido em pensamentos. Então virou-se para os
dois jovens e os encarou sem desfazer sua expressão serena.
— Hm... O amor se demonstra
de muitas formas. Dentro de uma amizade, dentro de uma paixão entre duas
pessoas que se atraem, dentro de uma relação entre pais e seus filhos... Somos
seres falhos. Vivemos errando e machucando uns aos outros. Mas, hm... O que
realmente nos faz reconhecer o amor é justamente reconhecermos que ferimos
alguém que nós amamos e o quanto essa constatação nos dói. O fato de pedirmos
perdão não nos torna inferior a ninguém, nos faz mais fortes. Afinal, precisamos
ser fortes para que possamos encarar o medo de enfrentar a rejeição que teremos
após magoarmos alguém. Hm. Você está banido do clã dos Dragões, senhor Duster.
O garoto ergueu as sobrancelhas.
O ar sumiu de seus pulmões e suas pernas ficaram bambas.
— M-Mestre…? Como assim, b-banido?!
— Você e seus colegas não
seguem os princípios do clã dos Dragões. A cidade de Blackthorn há muito tempo
vem sofrendo com comentários negativos pelo comportamento inapropriado dos
Dragon Tamers. Hm. E não é com esses princípios que os Pokémon Dragões devem
ser treinados, não se deve valorizar apenas a força. E eles não merecem ser
treinados por pessoas como o senhor, que inferiorizam oponentes pela cor da
pele.
— Mas... Clair e Lance,
senhor! Os Dragon Tamers mais poderosos do mundo! O poder deles...
— Hm. Você jamais será como
Clair e Lance.
As palavras do Mestre dos
Dragões atingiram Duster como um soco na cara.
— Clair e Lance tem uma
coisa que seus colegas jamais demonstraram ter. Amor. Um Pokémon deve sempre ser cuidado com amor e assim ele se
fortalecerá junto ao seu treinador. Amor. Cumplicidade. Confiança. É assim que
se constrói um verdadeiro Mestre Pokémon. Hm. A partir de hoje, todas as atividades
da Toca do Dragão estão encerradas. Foi bom enquanto durou, não é?
Duster fechou os punhos. O
ódio subia em suas veias e o fazia ranger os dentes.
— O senhor não pode fazer
isso! Eu não vou deixar! — Vociferou o rapaz.
O Mestre dos Dragões gargalhou
antes de se retirar pela porta.
— Você não tem poder algum
aqui, Duster Santiago.
O rapaz nada pode fazer.
Lágrimas caíam de seus olhos em direção ao tatame do dojô, seus punhos tremiam e
seus músculos se contraíam. Não era possível, aquilo não podia estar
acontecendo. Só tinha uma explicação, e ele sabia quem era o responsável por
aquele pesadelo.
— VOCÊ! — berrou o garoto,
com o dedo em riste apontando para Ethan. — A CULPA É TODA SUA! EU VOU ACABAR
COM VOCÊ!
Duster partiu em direção a
Ethan. Tyranitar deu um passo à frente e ficou entre o rapaz e seu treinador e
deu um rugido alto de aviso.
— Você acha mesmo que eu
vou temer um Pokémon como você? Richard, Dragon Pulse!
O Feraligatr abriu a enorme
boca e disparou uma bola púrpura na direção de Ethan e de Tyranitar. O garoto
então viu seu Pokémon receber o golpe e não se mover mais. Parado em sua
frente, Ethan temeu.
— Tyranitar! — Chamou o
garoto sem obter resposta. No entanto, o enorme Pokémon começou a rosnar. Seus
olhos começaram a ficar vermelhos e seu corpo emanou uma aura rubra. Dessa vez,
Duster arregalou os olhos e sentiu medo.
— Isso é... Esse golpe é
o...
Tyranitar rugiu. O chão
tremeu com fúria e aquele urro potente ecoou pelos corredores e alcançou o
salão de entrada da Toca do Dragão, colapsando tudo o que se chocava com a onda
sonora.
— O que está acontecendo lá
dentro?! — exclamou Clair.
— É a criatura que andou
treinando junto aos dragões, Mestra. Inclusive com Nádia —respondeu um dos
treinadores entre as ruínas de um local agora irreconhecível. Praticamente
demolido, o lugar antes enfeitado com pompa não passava de pedaços de concreto
e marfim espalhados por todos os lugares.
— Eu não reconheci o
rugido... Quem é esse Pokémon? — questionou Clair ao rapaz.
— Hm. Tyranitar — a voz do
Mestre dos Dragões surpreendeu os presentes.
— Tyranitar? Então o
Pupitar do Ethan... — comentou Forrest de forma surpresa.
— Mestre! Esse rugido... É
um Outrage, não é? — perguntou Clair
já sabendo da resposta.
— Hm. Precisamente.
Protejam-se — pediu o idoso batendo seu bastão de madeira com força no chão.
A força do golpe de
Tyranitar explodiu as paredes do dojô e arremessou Duster e Feraligatr. A
cortina de ar espalhou-se por todos os lados com violência, revirando tudo do
avesso. As estruturas do edifício não aguentaram tamanha pressão e vieram a
ceder.
A Toca do Dragão ia sendo
demolida com tamanha fúria que o quarteirão inteiro tremeu.
Ethan olhava assustado para
Tyranitar enquanto tentava se manter agarrado em uma viga de ferro da
construção que ainda insistia em se manter de pé fincada no solo. Não se via
mais rastros de Duster ou de Feraligatr, os dois estavam debaixo dos escombros
da construção. Tyranitar continuava a urrar e a disparar bolas de energia de
sua boca para todas as direções. O Pokémon virou-se na direção de Ethan e rugiu
para seu treinador. Um rugido pesado, que colocava pra fora toda a mágoa presa
em seu coração. Ethan temeu mais uma vez ao se ver sozinho perante um Pokémon
descontrolado. Olhou para os olhos de Tyranitar e não viu suas pupilas.
Tyranitar preparou-se para dar um soco, mas ao invés de acertar Ethan, atingiu
o próprio peito, caindo no chão berrando de dor.
— TYRANITAR! — berrava
Ethan. — TYRANITAR, POR FAVOR, PARE COM ISSO!
A enorme criatura
levantou-se outra vez e preparou outro soco. Ethan largou a viga de ferro e,
agindo por impulso, saltou na direção de Tyranitar, agarrando-se ao braço
esquerdo do Pokémon, que usou o braço direito para atingir-se na face, novamente
caindo ao chão.
— Tyranitar... Me
desculpe... Por favor, me perdoe... — Ethan começou a chorar. Abraçado ao corpo
ferido do enorme Pokémon, o garoto suplicava. — Pare de se machucar por minha
causa, você não merece passar por isso... Não merece mesmo!
Tyranitar abriu os olhos e
viu o treinador agarrado ao seu tórax. As lágrimas do menino escorriam pelas
laterais de seu corpo. Aquilo tocou o Pokémon, que grunhiu passando o braço
pelas costas de Ethan e o abraçando.
Havia perdão porque havia
amor.
TO BE CONTINUED...
Ai, senhor Dento!!!! Vai deitar a casa abaixo!!!
ReplyDeleteEsse capítulo foi tão boooooom! A nível descritivo, estava tudo lá, tudo no ponto, tudo ótimo!
O desenvolvimento das personagens também deve ser sublinhado.
Forrest que saiu em defesa do seu melhor amigo, combatendo esse racista nojento que o insultou. Gostei muito de o ver em ação com o seu Pokémon. Ele está tão mais forte, maduro e confiante... adoro ver!
Duster foi horrível, mas é o rival perfeito para o momento. É necessário voltar a reunir a força e o amor que rodeia Ethan e, para por tudo isso à prova, nada melhor do que o garoto idiota que só faz porcaria. No fim, ele teve o que merecia, não tenho pena se ele ficar ali enterrado.
Ethan colocou a mão na consciência. O esforço que já tinha iniciado no capítulo anterior para recuperar os seus Pokémon continuou neste, desta vez, encontrando o Pupitar evoluído num fantástico e potente Tyranitar. Apesar de toda a sua magnificência, o Pokémon parece ter os seus problemas interiores por resolver. Tenho a certeza que será uma caminhada feita com calma e com a ajuda de todos os membros da equipa do garoto.
Também achei muito interessante o discurso do Mestre e a sua dinâmica com Clair. Adoro velhinhos sábios, sabe? Acrescentam sempre aquele lado magnífico e misterioso à história.
Continua com toda a força, companheiro!
Yo Angie!
DeleteEu fico feliz demais que eu esteja com um nível tão bom de escrita... Algumas vezes, eu sinto que eu me cobro demais e tento sempre me superar em relação ao que já foi feito e ler seu comentário me deixa satisfeito, porque sei que está valendo a pena...
Por incrível que pareça, eu sou avesso à violência. Mas tem certas coisas que a gente não consegue controlar. Em situações assim, a última coisa que a gente pensa é em resolver na base do diálogo. Eu não critico o Forrest, não, talvez eu desceria a porrada também. UAHAUAHAUAH No fim das contas, a gente sempre se esforça pra ser melhor a cada dia, e isso se reflete nos nossos personagens aqui... Seja com brigas internas, como é o caso do Tyranitar, seja na busca de conseguir o perdão de quem a gente ama, como é a atual preocupação do Ethan. Aos poucos, nós vamos fazendo o máximo possível para ir acertando tudo...
Espero que eu continue te surpreendendo!
See ya!
PELO AMOR DE LUGIA, CARA! PARA DE DEMOLIR AS COISAS!
ReplyDeleteEthan vai atrás do último membro da sua equipe, e também o mais problemático. Nem dá pra medir o nível em que o Tyranitar está agora, porque ele varreu praticamente todos os treinadores da Toca do Dragão, que não são pouca coisa. E o Ethan se tivesse que batalhar com ele teria tomado uma surra como todos os outros, mas nosso menino recorreu às suas habilidades de protagonista e lançou a técnica suprema do diálogo (no caso deles quase uma DR) pra convencer o bichão a voltar pra ele.
E não é que deu certo? Tyranitar está de volta ao time, e certamente eles vão chutar incontáveis bundas até o fim da história! Ethan não deve ter nem noção do quanto o time dele subiu de nível só com a adição desse membro. Mas o fato é que isso é o que menos importa pra ele no momento.
Ethan fechou o bingo do Clã dos Dragões sem nem ser membro ou aprendiz deles. O mestre ficou impressionado com a sensibilidade nas respostas do garoto, respostas precisas de quem já aprendeu da vida as lições da maneira mais dura. E aí é que está a diferença entre ele e o Duster.
Duster, você não merece ter um Feraligatr, seu fudido!
Agora que as coisas parecem ter se acertado, pelo menos internamente no time do Ethan, é hora da revanche contra a Clair! VEM, ÚLTIMO GINÁSIO! VEM, ÚLTIMA INSÍGNIA!
Até a próxima! õ/
Yo ShadZ!
DeleteEu juro que eu tento, mas esses bichos são incontroláveis! UAHAUABAUAHAH
Finalmente temos nosso pseudo-lendário favorito em sua forma definitiva. E haja força! O bicho destruiu tudo à sua frente e se não fosse nosso poder da amizade, sabe-se lá o que poderia acontecer... Mas, brincadeiras a parte, valeu o esforço do Ethan pra se reconectar com o Tyranitar... Ele está começando a ser um treinador de verdade e um ser humano melhor quando consegue sentir e trabalhar com sua empatia.
Agora com o time calibrado, com a skill aprimorada e um ardente fogo nos olhos, nosso estimado herói parte para o X1 contra a maior de todas! O que será que vai pegar?
Espero que eu consiga te surpreender!
See ya!