Archive for February 2019
The Omascar - Coração de Ouro & Alma de Prata
Era a primeira vez que a região de Johto
recebia um evento de tamanho porte. Claro, havia a Liga Pokémon que era
organizada há anos com toda pompa, mas o evento daquela noite tinha tudo para
superar todas as barreiras de um espetáculo fantástico. Há alguns anos, Canas Ominous, grande
empresário das longínquas terras de Sinnoh tenta trabalhar no licenciamento de
tal evento, uma noite de gala onde grandes personagens receberiam um prêmio
incrível por grandes colaborações feitas à indústria do entretenimento, o Omascar.
Acontece que ninguém parecia interessado em
sediar tamanho evento. E os motivos eram diversos: Divergências artísticas
entre personagens, empresários que abandonaram o ramo do entretenimento e
fecharam seus continentes para qualquer tipo de investimento cultural, regiões,
como Hoenn, que passaram por uma imensa reforma em sua infraestrutura e
praticamente buscaram recomeçar novas parcerias comerciais para reestruturação
de sua administração... Os tempos eram difíceis.
Buscando expandir seus negócios, Dento,
revolucionário do agronegócio, procurou certo dia Canas Ominous, que estava de
passagem por Johto divulgando seu evento. Os dois se encontraram em uma das
mansões de Dento, em Goldenrod, onde colocaram seus objetivos empresariais na
conversa e surpreendentemente tal conversa gerou uma grande amizade entre os
dois, apesar de claramente se falarem apenas por interesses em comum.
Dento aceitou organizar o Omascar em sua
região, Johto, após dois anos da proposta inicial.
A notícia estampou manchetes de jornais e
revistas por toda a região no dia seguinte. A euforia popular se mostrou
enorme, assim como a ansiedade pela data divulgada: Dezessete de Fevereiro.
Pôsteres com as fotos de Canas Ominous e Dento foram espalhadas por vários
outdoors e fotos dos dois eram exibidas ininterruptamente nos canais de
televisão. Chefes de Estado logo prontificaram-se a aparecer, como o Presidente
das Ilhas Federativas de Hoenn — muito a contragosto de Dento, é verdade, já
que sempre houve uma briga entre os dois países pelo controle de certos
territórios e ilhas — e o presidente da nação vizinha, Kanto — também a
contragosto de Dento, afinal, por não serem divididas, Kanto e Johto tendiam a
sediar grandes conflitos.
Mas como o evento era de propriedade do senhor
Canas Ominous e cabia a Johto apenas sediá-lo, as birras políticas de Dento não
seriam levadas em consideração.
***
O Teatro Municipal de Ecruteak, um dos mais
importantes e históricos da região de Johto, fora reservado para aquela noite.
Milhares de pessoas se aglomeravam próximas ao local, bloqueando ruas e
avenidas a quadras de distância. A imprensa compareceu em peso e brigou para
conseguir o melhor lugar próximo ao tapete vermelho onde os artistas que
compunham o elenco do Aventuras em Johto™ passavam para entrar para o evento.
De figurantes a protagonistas, de humanos a Pokémon, muitos deles paravam e
posavam simpáticos para as fotos. Outros, visivelmente constrangidos, só
queriam sair logo daquele mar de flashes e seguir para dentro do teatro,
decorado com luminárias banhadas a ouro, vários ornamentos de prata e, claro,
diversas celebridades com acessórios feitos a base de cristal.
Realmente não houve limites para o orçamento
investido. Dento conseguiu alianças com diversos patrocinadores para garantir
que o evento se concretizasse. Afinal, ele não pagou um único tostão do próprio
bolso — pão duro e mão de vaca do jeito que era, dificilmente o evento
ocorreria se dependesse única e exclusivamente dele.
Primeiro alarme sonoro, 19h40min.
Aos poucos, todos os convidados foram tomando
seus lugares no teatro. Na plateia, os concorrentes e seus convidados. Os
Chefes de Estado com seus amigos e família assistiriam dos camarotes, cercados
de seguranças que impediriam o acesso de qualquer pessoa de fora.
Segundo alarme sonoro, 19h50min.
Primeiras-damas estavam elegantemente
vestidas, com roupas especialmente desenhadas para elas, únicas em todo o Mundo
Pokémon, o que causava suspiros de quem estava na plateia quando percebiam suas
chegadas. Seus maridos estavam nos camarins, prestes a subir ao palco e iniciar
o evento.
Terceiro alarme sonoro, 20h.
Pontualmente às oito horas da noite, as
grandes cortinas vermelhas de veludo se abriram. O quase ensurdecedor barulho
da ovação da plateia fez vibrar o chão de madeira do enorme palco e arrepiar os
pelos do corpo de Canas Ominous, que há tempos sem encarar uma plateia,
permitiu-se ficar tímido por um instante e, a passos lentos, dirigiu-se ao
pedestal no centro do palco onde um microfone aguardava para amplificar sua voz
para todo o teatro.
— Caham
— Canas limpou a garganta.
Aos poucos, as ovações foram diminuindo. Todos
olhavam atentos ao empresário, afilhado de Walter Wallers, campeão por muitos
anos da Elite 4 de Sinnoh, talvez a maior de todos os tempos. O terno alinhado,
a gravata azul listrada e a barba perfeitamente aparada até disfarçavam que por
dentro, o homem tremia como criança.
— Muito boa noite, caros cidadãos de Johto e
convidados da noite. Hoje eu trago a vocês um evento que marcou a minha vida. O
Omascar é uma celebração que com muito gosto desenvolvi lá em Sinnoh e, durante
algum tempo, cogitei levar até outros continentes e países. Há dois anos, fiz
minha primeira proposta a Dento, o nobre presidente de Johto, mas as
negociações não foram para frente. Hoje, finalmente posso dizer que estou feliz
em estar aqui, abrindo este evento maravilhoso.
As palmas do público após o término do
discurso de Canas aqueceram seu coração. Lembranças de Sinnoh vieram à sua cabeça.
Quantas aventuras ele pôde assistir seus personagens vivenciarem no Aventuras
em Sinnoh? Reviver esses pensamentos enquanto ele estava ali, assistindo novas
gerações concorrerem àquele prêmio sagrado dava fôlego novo a ele.
— Tenho o prazer de convidar ao palco o grande
responsável por essa noite. O senhor Francisco Dento, recebido com uma salva de
palmas! — anunciou Canas puxando as ovações.
Dento surgiu no palco com uma coroa feita
completamente de ouro e uma longa capa vermelha. Seus trajes reais foram
acompanhados de uma intensa salva de palmas, afinal, era aquele homem que
trazia felicidade ao povo de Johto. Seu ego era enorme e ninguém questionava as
suas excentricidades no governo.
O homem aproximou-se do microfone e agradeceu
ao carinho do povo.
— Obrigado, obrigado queridos convidados. Este
evento foi realizado, claro, graças a mim. Claro que o projeto é todo do senhor
Canas Ominous, mas quem liga, não é mesmo? Hoho — Dento deu uma risada falsa e
a plateia gargalhou. — Creio que preciso agradecer...
Dento olhou para Canas, afastou-se do
microfone e cochichou ao empresário.
— Preciso mesmo
dizer o nome dele em voz alta? Não dá mesmo
pra fingir que a ideia foi toda minha? — questionou com um olhar de súplica,
rezando para que o dono da festa concordasse.
— Sim. Eles também ajudaram a organizar este
evento — explicou Canas.
Dento bufou.
— Tá. Então, como eu ia dizendo, eu preciso agradecer a eles... Senhor
Shadow Tails, presidente de Hoenn e o Senhor José Killer, da vizinha Kanto... —
sorriu forçadamente.
Ambos levantaram-se das arquibancadas sob uma
forte salva de palmas. Shadow usava um sobretudo negro por cima das roupas
sociais com uma gravata borboleta verde de destaque no pescoço e discretamente
acenava à plateia. Killer visivelmente havia tentado se arrumar em cima da
hora, mas acenava eufórico para a plateia, emocionado com os aplausos.
— Muito bem, muito bem, vamos começar. Passo a
palavra e a apresentação para o senhor Canas Ominous! — voltou a anunciar
Dento. — Na verdade, nós queríamos o Silvio Santos, mas ele está de férias em
Unova. Canas, você sabe como funciona a apresentação, certo? Então fique a
vontade.
Dento e sua coroa se retiraram do palco, sob
forte aplauso do público.
Canas, agora o mestre de cerimônia oficial,
dirigiu-se até o microfone.
— Bem... Não era bem isso o que estava
combinado, mas eu acho que imprevistos fazem parte do show. Bem, preciso dos
envelopes com os resultados. Onde estão?
Vivian Chevalier entrou tropeçando na cortina
lateral. Segurando envelopes de cor carmim, a garota dirigiu-se nervosa para
Canas. Usava um vestidinho rodado de cor vermelha, que fundia quase que
perfeitamente com seus cabelos ruivos. Ela esticou as mãos tremidas para o
mestre de cerimônia e entregou os resultados da premiação. Canas agradeceu com
um sorriso e Vivian tratou de correr para a lateral do palco e se esconder nos
bastidores, morrendo de vergonha.
— Muito bem, senhoras e senhores. Tenho em
minhas mãos os resultados das categorias votadas por vocês, o público. E para
começarmos, vamos descobrir quem foi o
melhor protagonista do Aventuras em Johto nessas duas primeiras temporadas!
— Canas abriu o envelope e deu um sorriso de canto de boca. — Sinceramente, eu
não me surpreendo. O vencedor é Ethan!
O garoto abriu a boca, surpreso. Sob uma
intensa salva de palmas — e genuinamente aclamado por Amy e Forrest —,
levantou-se da plateia e dirigiu-se ao palco, tremendo de nervoso. A pequena
estatueta foi entregue pelas mãos de Dento — agora vestido a caráter — e Ethan
aproximou-se do microfone para agradecer o público.
— Obrigado, muito obrigado. Eu realmente não
estava esperando sair vencedor hoje, afinal, tem tantas pessoas queridas
concorrendo que fico até surpreso de poder ter a honra de ser chamado de
vencedor também. Dedico esse prêmio primeiramente à minha mãe, Marieta e,
claro, aos meus melhores amigos, Amy e Forrest, que dividiram essa história
comigo até aqui. Obrigado também ao meu fã clube que veio em peso e ao público
de casa que fez questão de votar. Esse prêmio é de todos vocês — os olhos de
Ethan encheram de lágrimas. Os aplausos voltaram a tomar conta do ambiente enquanto
o garoto retirava-se emocionado do palco.
Dento aproximou-se do microfone.
— Na próxima categoria, melhor participação secundária, grandes nomes que marcaram
ahistória do Aventuras em Johto. Se perguntar pra qualquer um agora, nesse
exato momento, várias pessoas darão bons motivos para os indicados dessa
categoria sagrarem-se vencedores. Dos rivais Joey e Lyra, que tiveram
um desenvolvimento importante nessas duas temporadas e ajudaram a dar uma
balançada na história à Silver e Jasmine, que com certeza se destacaram
por prover aos protagonistas importantes conflitos psicológicos necessários
para amadurecê-los. E, claro, personagens como Vivian Chevalier, que apesar de uma curta participação no final de
Alma de Prata, trouxe todo um equilíbrio e leveza para um clímax tão esperado
no meio da história. Qualquer um dos nomes aqui citados tem potencial pra levar
esse prêmio para casa, então fico muito feliz com qualquer que seja o resultado
— Dento abriu o envelope e ergueu uma das sobrancelhas. — A maioria esmagadora
dos votos. O fã clube do Ethan faz bastante barulho, mas o desse personagem é
avassalador. Joey, o prêmio é seu.
A estrutura do teatro quase veio abaixo,
tamanha a ovação pelo rapaz. Com um sorriso convencido, Joey levantou da mesa,
alinhou sua gravata e dirigiu-se ao palco, acompanhado de seu Rattata no ombro,
enfeitado com uma gravata borboleta. Canas Ominous entregou a estatueta para o
garoto, que encarava a plateia orgulhoso.
— Não tenho muito o que dizer, apenas agradeço
por estar aqui hoje e a todos os meus fãs que votaram em mim nessa categoria.
Tenho certeza que eu ganharia todas as categorias que concorresse, mas sou
humilde e, portanto, outros personagens podem brilhar também, apesar de o meu
brilho ofuscar demais. Enfim, obrigado a todos.
Joey curvou-se perante a plateia e continuou
sendo ovacionado pelo público, até sentar-se novamente na mesa de gala onde
estava. De todos os presentes, Ethan era o único que não parecia satisfeito em
ver o garoto vencer.
Canas voltou a aproximar do microfone com um
terceiro envelope carmim nas mãos.
— Categoria polêmica: Melhor antagonista. Durante a votação, foi uma das categorias que
mais ficou dividida, até o resultado final. Os gráficos mostraram muitas poucas
variações entre os candidatos. Para fins de comparação, Joey empatou com Red. Apesar dos votos bastante
acirrados, foi uma das categorias que mais gostei da briga. Hoje, o prêmio vai
para você... — Canas abriu o envelope. — Baoba!
Vaias tomaram o local. Não que Baoba em si
fosse ruim, mas o personagem em Alma de Prata causou bastante controvérsia nos
dois capítulos que estrelou. Em uma recente pesquisa, comprovou-se que Baoba
foi um dos grandes responsáveis por mostrar a direção que o roteiro de
Aventuras em Johto tomaria.
— Agradeço os votos recebidos e é uma honra
pra mim ter vencido e ser um personagem que marcou os leitores. O resultado
deste prêmio só mostra que há espaço para grandes vilões que não precisam tomar
a história toda pra si. Obrigado.
Dento entregou a estatueta e Baoba voltou ao
seu lugar, sob forte protesto do público.
— A próxima categoria é a de melhor capítulo. Após 50 capítulos, o
público teve de escolher entre alguns selecionados por mim como os que mais
causaram debates e ainda são mencionados pelos leitores como favoritos de toda
a história. Foi uma briga boa, apesar de quase ter dado empate em dois
capítulos do mesmo arco, que marcaram a história como a melhor batalha até
hoje. Sem mais, notifico o grande vencedor e convido ao palco suas estrelas —
Dento abriu o envelope. — Capítulo 39: A
Luz da Meia-Noite.
Ethan e Jasmine levantaram das mesas e, antes
de subir ao palco, abraçaram-se com ternura. Algumas das pessoas na plateia
gritavam “Ethamine! Ethamine”, apesar de eles sempre dizerem que não havia nada
entre eles se não uma amizade fraterna. De mãos dadas, passaram pelo corredor
que dividia os setores da plateia e subiram as escadas do palco.
Jasmine aproximou-se do microfone, emocionada.
— Eu não tenho nem o que dizer. Estou muito
feliz de ter conquistado esse prêmio, e mais ainda por ter o Ethan comigo aqui
hoje. Uma vez me disseram que o Aventuras em Johto é dividido entre antes de
Olivine e pós-Olivine e fico feliz por ter sido tão marcante nessa história.
Agradeço a todos que votaram, mas dedico esse prêmio ao Amphy, onde quer que
esteja.
Jasmine e Ethan agradeceram as estatuetas
entregues por Canas sob uma chuva de aplausos. Ninguém reparou, no entanto,
quando o garoto discretamente olhou para Joey e fez um olhar soberbo para o
eterno rival.
Canas anunciou a próxima categoria.
— Em melhor
Pokémon, um resultado pra lá de polêmico. Não questiono a votação, afinal,
foi o público que elegeu, mas acredito que outros tinham chance melhor de
sagrarem-se vencedores. Apesar de tudo, é como o Dento disse, o público desse
personagem é avassalador. Rattata do
Joey, você é o melhor Pokémon do Aventuras em Johto até aqui.
Outra ovação que fez o chão tremer. Joey e
Rattata eram tratados como popstars, reis de um país importante. O público
aplaudia com paixão os dois, que subiam no palco com toda a pompa e
importância.
— Mais uma vez, é incrível estar aqui. Falo,
em nome do meu Rattata, que estamos gratos pelo público leitor do Aventuras em
Johto que tornou isso possível. E, claro, ao Ethan também, por ser esse rival
que eu massacro em todas as batalhas. Obrigado.
Ethan ficou vermelho de raiva. Se não fosse
por Amy e Forrest o segurando na cadeira, claramente ele correria para cima do
palco e socaria o rosto de Joey até quebrar cada um dos seus dentes.
Dento entregou a estatueta para Rattata e
posicionou-se em frente ao microfone, com mais um envelope em mãos.
— Agora, a categoria de personagem mais poderoso do Aventuras em Johto. Ethan enfrentou
muitos personagens habilidosos que o fizeram usar a cabeça para elaborar
estratégias boas o suficiente para enfrentá-los. Não necessariamente essas
estratégias o levaram a vitória, por uma série de fatores. O grande público escolheu o grande personagem
poderoso, aquele que demonstrou, sem sombra de dúvidas, quem é o melhor-pior
oponente já enfrentado por Ethan ou outros personagens. Aquele que, sem sombra
de dúvidas, foi uma pedra no sapato, que fez o público delirar com suas
estratégias fantásticas e com habilidades incríveis com seus Pokémon supremos —
Dento abriu o envelope, o leu e encarou de forma séria a platéia. — A estatueta
do mais poderoso vai para, claro, ele. Red
e seu Charizard!
Apesar de estar vestido com um terno luxuoso
desenhado para seu corpo com uma gravata vermelha e sapatos sociais perfeitamente
engraxados, Red não tirou seu boné — o que causou certos comentários na platéia
sobre o look escolhido. No entanto, se Joey era visivelmente o queridinho do
público, Red mantinha sua soberania no local. As pessoas o olhavam admiradas,
agradecidas por estarem no mesmo ambiente que o lendário treinador. Todos
sabiam da sua fama de ser um cara de poucas palavras, então a ansiedade para
ouvir seu discurso da vitória era grande.
Canas logo entregou a estatueta para Red. O
garoto encarou seu público e liberou Charizard da PokéBola. O Pokémon Dragão
rugiu, expelindo chamas de sua bocarra.
— Fico feliz por ter conquistado este prêmio.
Muito obrigado ao público que votou em mim.
O rapaz assim como veio, retornou ao seu
lugar. Canas Ominous voltou a conversar com a platéia.
— Parece que a fama de Red de ser um rapaz de
poucas palavras não é só um mito, não é mesmo? Nossa próxima categoria é o melhor Líder de Ginásio! Como o Dento
bem comentou, Ethan passou por diversos desafios nessa jornada e os Líderes de
Ginásio, com certeza, foram fundamentais para o seu desenvolvimento como
treinador. Não só dele, claro, mas também de muitos outros jovens que sonham em
conquistar a Liga Pokémon, como é o caso de algumas figuras aqui presentes,
como Lyra, Joey e até mesmo Red, na época em que treinava. O que me
surpreendeu, na verdade, foi a esmagadora vitória deste Líder, 80% dos votos.
Fico muito feliz por poder presenciar isso.
Whitney levantou de seu lugar e já se dirigiu
ao palco para receber sua estatueta.
— O melhor Líder de Ginásio do Aventuras em
Johto: Coração de Ouro & Alma de Prata foi você, Jasmine!
Whitney paralisou a ver que Canas não chamou
seu nome. Seu sorrisinho convencido e vitorioso apagou-se instantaneamente. Ao
perceber que todos a olhavam, sentiu o rosto arder de vergonha e logo começou a
chorar, correndo em disparada na direção à saída do teatro. Apesar da situação
inesperada, o público não deixou de saudar Jasmine, que timidamente avançou até
o palco, sob aplausos intensos. Foi Canas que entregou uma estatueta para a
mulher desta vez.
— Eu realmente estou muito emocionada. Eu não
esperava sair vencedora, muito menos levar dois prêmios pra casa. Com certeza,
hoje é o melhor dia da minha vida!
As lágrimas escorreram pelo rosto de Jasmine,
desta vez, de felicidade, comovendo o público que respondia com uma acalorada
salva de palmas. Aparada por vários personagens, foi conduzida até seu lugar.
— Uma categoria que gosto muito. Além de todo
drama, ação, aventura e romance, sempre existem aqueles personagens que surgem
para dar uma aliviada nas tensões. Certas vezes, acabam sendo até mais
populares que os personagens principais. Durante o Aventuras em Johto, tivemos
alguns casos do tipo e nesta votação, o público demonstrou gostar do poder de
um bom personagem simpático. Mas, no caso, são vários personagens simpáticos. O vencedor do miss
simpatia é... — Canas abriu o
envelope. — O Fã-Clube do Ethan!
Era o motivo que faltava para os velhinhos fazerem uma
algazarra. Dentaduras e bengalas eram arremessadas para cima enquanto os idosos
vibravam mais do que o público. Os velhinhos, de forma lenta, se dirigiram ao
palco, apesar de não perderem a felicidade. Katherine se dirigiu ao microfone
após receber das mãos de Dento a estatueta da vitória.
— Estou muito feliz em ganhar esse prêmio. Eu dedico
ao Ethan, o maior treinador Pokémon de todos os tempos! É por ele que estamos
aqui hoje e é por ele que nós nos tornamos fitness, afinal, cruzar uma região
inteira atrás dele não é fácil, não é mesmo? É NÓIS!
Katherine virou-se para abraçar os amigos e, juntos —
ainda fazendo a maior baderna —, retiraram-se do palco, fazendo caretas e
falando palavrões para o público presente.
— Ai, como eu amo esses velhinhos... — comentou Dento.
Uma bengala atingiu sua testa.
— Velha é a sua avó! — exclamou um dos velhos do fã
clube, visivelmente indignado com o comentário do mestre de cerimônias,
rapidamente detido por seguranças. — EU SEI DOS MEUS DIREITOS, ME LARGUEM
PATIFES, ME LARGUEM!!!
Dento levantou-se com uma das mãos na testa. Havia um
galo onde a bengala o atingiu.
— Estou bem. Vamos dar prosseguimento à cerimônia.
Começamos hoje falando sobre o melhor personagem principal e agora, temos o melhor personagem revelação. O que me
surpreendeu nesse resultado foi que, de alguma forma, a revelação foi ao mesmo
tempo um renascimento do personagem, que passou metade da história na sombra de
outros. Esse prêmio é a constatação do público do esforço de um personagem que
sempre mereceu disputar e brilhar no seu espaço de protagonista. Forrest, o prêmio é seu.
O moreno abriu a boca, incrédulo. A ovação da platéia
foi imensa, o público realmente parecia concordar com a popularidade do garoto.
Amy e Ethan levantaram-se para abraçar e congratular o amigo, visivelmente
emocionado. Forrest, vestido a rigor, se dirigiu ao palco com as mãos na boca,
questionando se aquilo fazia parte de um sonho. Canas entregou a estatueta para
o garoto e logo ele se dirigiu ao microfone.
— Eu não acredito que estou aqui neste momento. Faltam
palavras para demonstrar a minha gratidão a todos que votaram em mim, que
estiveram do meu lado e que acreditam em mim. Claro que uma história como o
Aventuras em Johto é como uma novela, uma obra aberta que vai se adaptando
conforme o tempo vai passando e ajustando-se conforme o feedback do público.
Apesar de eu saber que eu tenho meus amores e meus desafetos, tenho ciência que
o meu personagem causa uma ansiedade enorme nos leitores. Eu não posso dizer
muito por questões contratuais, mas na próxima temporada eu vou me esforçar
para surpreender cada um de vocês, meus leitores e amigos. Muito obrigado. Esse
prêmio eu dedico, claro, à vocês, aos meus amigos Ethan e Amy e principalmente
ao meu irmão Brock, que sempre acreditou em mim.
Forrest foi ovacionado pela platéia, apesar de ter
ouvido algumas vaias também. O garoto estava feliz pela conquista, nada o
abalaria.
Canas aproximou-se do microfone.
— Agora, finalmente, a última categoria da noite.
Gostaria de chamar meu companheiro, Dento, para anunciá-la comigo.
Dento aproximou-se de Canas com o último envelope, que
continha o último vencedor da última categoria.
— Todos os personagens precisam ter uma química. Isso
permite que eles possam ser desenvolvidos e terem apreço do público. Durante o
Aventuras em Johto, nós tivemos muitas histórias entre personagens. Histórias
de amizades, de rivalidades, de perseguições, de lutas e de tristezas. Claro,
muitas histórias de amor aconteceram para satisfação do público. Eu tenho
certeza que, na categoria melhor casal,
nós temos muitas sugestões potencialmente canônicas.
— Apesar de eu, particularmente, achar Ethamine o
maior casal da história, não é isso que os leitores decidiram.
Canas abriu o envelope, mostrou para Dento e ambos
anunciaram de forma sincronizada os nomes escritos no papel.
— Ethan e Amy!
Os dois se olharam. Ethan morreu de vergonha. Amy deu
um sorriso sem graça. Ela estava vestida com um Qipao vermelho — um típico
vestido tradicional chinês — que elegantemente desenhava as curvas de seu
corpo. Ela entrelaçou o braço direito no esquerdo de Ethan e juntos caminharam
até o palco, sobre aplausos e assovios dos presentes.
Canas e Dento entregaram duas estatuetas para cada um.
Amy se dirigiu ao microfone.
— Obrigado a todos que acreditam que eu e Ethan somos
o melhor casal da história. Eu também acredito — riu ela. — É um prazer poder
ser indicada, e vencer já é um sonho realizado. Muito obrigada a todos e em
especial ao Ethan, meu eterno parceiro, meu melhor amigo, que venceu junto
comigo.
A platéia bradava “Beija! Beija!”, fazendo Ethan suar
frio e querer enterrar seu rosto na terra, como um avestruz. Amy riu de
nervoso, mas dirigiu-se até o amigo e o roubou um selinho demorado, para
delírio do público.
Se Ethan estava vermelho quando subiu ao palco, o tom
de sua pele agora podia ser comparado às cortinas carmins que abriam e fechavam
o palco.
— Agradeço a todos que vieram prestigiar o Omascar
esta noite. Agradeço pelos votos e por todo suporte dado nesses anos de
publicação. Muito obrigado! — agradeceu Dento a platéia.
— Foi uma honra pra mim ser convidado a apresentar
essa premiação. Eu não sei quando Mente de Cristal irá ser encerrada, mas com
certeza outros Omascar poderão ser sediados aqui em Johto, foi muito positivo!
Obrigado, senhoras e senhores, e boa noite a todos!
Sob aplausos da platéia, as cortinas se fecharam.
Dento e Canas sorriam, satisfeitos, pelo sucesso da apresentação.
***
As palavras
do autor, Dento:
Escrever pra
mim é algo que vai muito além de colocar palavras no papel. Talvez seja um
momento em que eu me desligo da vida real e embarco em um universo que me dá
prazer em explorar — apesar da ironia de que nem sempre nesse universo que eu
escrevo eu consigo manter o controle de tudo. O Aventuras em Johto é um projeto
que me acompanha há dez anos, mesmo que muitos leitores só o acompanhem a um
tempo mais curto. Publicar cada capítulo, semanal ou não, é inconscientemente
publicar uma parte da minha vida, dos meus paradoxos e pensamentos, e abri-los
francamente com você, leitor, que está sempre disponível para enxergar a
realidade de cada vírgula, parágrafo e diálogo, mesmo que estas apenas
transcrevam um mundo fictício que é baseado em um mundo fictício. Aventuras em
Johto: Coração de Ouro/Alma de Prata traz em sua ficção uma verdade que é tão
real que as pessoas talvez não acreditem, ou que, assim como eu, apenas preferem
embarcar nesse universo cheio de complexidades para esquecer um pouco dos seus
próprios complexos. Ethan, Amy e Forrest com certeza já se tornaram personagens
que não pertencem mais a mim ou à Johto, mas são parte da vida de várias
pessoas que dedicam seu tempo a acompanhar as aventuras desse trio incrível que
carrega consigo a responsabilidade de representar cada um de nós em diversas
fases da vida, seja na busca da independência, como a Amy, seja no desejo de se
reinventar, como Ethan ou até mesmo de seguir seus sonhos, independente de
tudo, como Forrest.
Se os
personagens são gratos a você, imagina eu.
As palavras
do leitor, Canas Ominous:
Eu gosto de
assistir cerimônias reais, todo ano vejo cada filme indicado no Oscar e fico
elaborando minhas próprias teorias de quem será o vencedor; gosto de discutir
com outras pessoas que também curtem filmes, animações e música. Essa ansiedade
por descobrir quem será o vencedor é sempre arrebatadora, muitas vezes não é
quem gostaríamos, mas se o tiro é certeiro também bate aquela alegria — eu
falei, eu falei! Sinto-me um critico de verdade, não que minha opinião seja de
muita relevância... *risos* Organizar um evento desses, por menor que seja se
comparado aos gigantes da indústria, traz um sorriso ao meu rosto por ver
tantos personagens bacanas que tive a oportunidade de acompanhar sendo
consagrados, como o Forrest, por exemplo, que começou a tomar forma depois dos
vários puxões de orelha que o autor levou. Ele cresceu, e mereceu esse
reconhecimento. Mordo minha língua ao dizer que votei nele, porque o
desenvolvimento foi ótimo e ele alcançou um novo patamar. Que continue nos
surpreendendo!
O Omascar
sempre serviu como termômetro para sabermos da reação dos leitores, em quem
acertamos e quem merece mais atenção. É recompensador. Se não fosse pelos votos
de vocês, essa premiação não seria tão divertida. Isso é até engraçado, porque
estamos aqui comemorando a conquista de nossos queridos personagens — protagonistas,
antagonistas, recorrentes e Pokémon — que
nos acompanham desde 2015 nessa longa jornada do Aventuras em Johto, mas no fim
da noite o prêmio de verdade vai para o autor, que tornou tudo isso real e
sempre nos entrega um trabalho de qualidade. Os holofotes são todos deles essa
noite, e quem sabe no futuro ainda não tenhamos a chance de assistir Francisco
Dento abrindo uma premiação dessas de verdade, não é mesmo?
Aventuras em Ransei
Nobres confrades de reinos distantes e terras ainda não descobertas,
Vos envio esta mensagem informando-lhes que a Warlord Shiny Reshiram desembarcou em sua região, Ransei, onde há relatos de que contará uma história repleta de guerras, intrigas de sangue e paixões proibidas. Convoco a todos os que esta mensagem ouvem para conferir o Prólogo que já se encontra presente em terras que só ouvimos falar em nossos sonhos mais intrigantes!
Espero receber-lhes de espadas empunhadas!
Lord Dento, Imperador do indomável reino da Aliança Aventuras.
Segundo Ato
— A culpa é
sua!
— Não, a
culpa é sua!
— Cala essa
sua boca! Se você não fosse um baita guloso que tem que sair pra comer um
lanchinho a cada cinco minutos, o chefe não tinha sumido!
— Você sabe
da minha dieta especial! A culpa é sua que, ao invés de ficar protegendo o
chefe, fica no refeitório se lambuzando também!
— Ora,
seu...!
— Ora,
seu...!
— Chega! — a
poderosa voz de Arcanine ecoou pela sala.
Snorlax e Lickilicky se encaravam furiosos. O
delegado Arcanine, farto de tamanha desordem, bateu na mesa e chamou a atenção
dos dois com seriedade.
— Aqui não é lugar para discussões. Vocês estão
sendo interrogados para sabermos aonde foi parar Papai Noel. Se não
colaborarem, eu vou prender os dois por toda a eternidade, estão me ouvindo?
Ótimo, parece que estamos começando a nos entender.
Os dois
Pokémon enormes mal se encaravam. Arcanine respirou fundo e voltou a fazer suas
perguntas.
— Muito bem,
deixa eu ver se entendi. Vocês dois são contratados para protegerem a vida do
senhor Nicolau Noel e ele desaparece. Evapora como se fosse fumaça. Como isso é
possível?
Silêncio.
— Então, doutor, esse é o problema. Nós não
sabemos — comentou Snorlax com um tom de preocupação.
— Ninguém tem acesso à sala do Papai Noel. Ele
é uma figura importante, conhecida. Temos ordens expressas para não deixar
ninguém se aproximar de sua sala— Lickilicky complementou.
— E só vocês dois guardam a porta ou mais
alguém tem acesso ao Senhor Nicolau?
Snorlax e Lickilicky se entreolharam e
refletiram por um instante.
—
Bem, como qualquer outra pessoa importante, o doutor Noel tem seus amigos,
convidados, empregados... Apesar de termos ordens expressas para não deixar
ninguém acessar sua sala, existem outras pessoas com tanto acesso quanto nós,
mas são funcionários de confiança...
—
Veja bem, o senhor Noel trabalha só uma vez por ano na entrega dos presentes...
Mas nos outros trezentos e sessenta e quatro dias ele se fecha na fábrica, onde
os brinquedos são fabricados.
— Dá
muito trabalho, sabe, doutor? Fabricar pecinha por pecinha, olhar a lista de
crianças que foram boas e más, ainda por cima ter de fazer passeata em shopping
em época de Natal, é bastante cansativo! Precisa-se de muitos ajudantes, que façam
agenda de eventos, que verifiquem se o trabalho dos fabricantes dos brinquedos
está sendo bem realizado, ler as milhões de cartinhas que chegam todos os
anos...
—
Sim. Nós somos apenas seguranças, mas existem certos Pokémon que tem acesso
livre para que o trabalho possa ser bem realizado e a tempo.
Arcanine
coçou o queixo.
— Hmm...
Então quer dizer que outros além de vocês também têm acesso ao senhor
Nicolau... Quem seriam?
—
Depende bastante.
—
Bem, tem por exemplo Stantler, que é o chefe das renas, né? Ele precisa dar ao
senhor Noel uma espécie de relatório sobre as renas que o carregam durante a
noite do dia 24.
—
Sim, ele informa, por exemplo, a respeito da dieta que elas estão fazendo, se
estão fazendo exercícios...
—
Também tem o Delibird, que auxilia justamente com a administração geral. Ele
seria como um braço direito do senhor Noel.
—
Ele costuma saber de tudo o que acontece no Polo Norte. É função dele.
Arcanine
ergueu uma das sobrancelhas.
—
Então esse tal de Delibird pode saber por onde anda o senhor Nicolau, certo?
—
Acho bastante provável, apesar da gente não o ver muito.
—
Por quê? — perguntou Arcanine.
—
Bem, geralmente ele não fala com ninguém.
—
Ele apenas responde ao senhor Noel, ele é bastante fechado.
A
porta da sala de Arcanine se abriu. Por ela, Graveler, acompanhado por dois
Pokémon, adentrou e se dirigiu ao delegado.
—
Senhor Arcanine, temos novidades a respeito do caso.
Arcanine
olhou para Snorlax e Lickilicky.
— Os
dois policiais vão terminar de recolher seus depoimentos.
Lickilicky
e Snorlax viraram-se e depararam-se com Growlithe e Ledian que os
cumprimentaram de forma séria.
Arcanine
e Graveler se retiraram da sala.
— E
então, o que está acontecendo?
— Um
grande problema... — comentou Graveler de forma séria.
***
Em
uma das camas da enfermaria o corpo de Jynx encontrado no dia anterior
permanecia intocado. Não por falta de competência das enfermeiras Chansey que
cuidavam muito bem do Pokémon, mas nenhum tipo de progresso parecia ter
acontecido. O Pokémon continuava a olhar para o nada com a mesma expressão de
espanto que causava desconforto aos que viam.
A
grande pergunta era saber o que tinha acontecido.
A
polícia, claro, já suspeitava de que tinha algo a ver com o sumiço do Papai
Noel. Descobriu-se que Jynx era uma das empregadas de Noel, responsável por
auxiliá-lo no Polo Norte na entrega dos brinquedos. Sendo humanamente
impossível fazer em uma única noite uma viagem ao redor do mundo e entrar em
todas as casas, uma após a outra, tais assistentes viajavam junto com Noel e
também distribuíam os brinquedos debaixo de árvores de Natal. Não
estranhamente, existem diversos relatos de crianças que por eventos diversos
acabaram surpreendendo as assistentes durante a noite de Natal e no dia
seguinte contava aos pais que Papai Noel era uma Jynx.
Claro
que isso também, por um lado, ajudava na lenda de Papai Noel. Os adultos, por
exemplo, não acreditavam na figura do bom velhinho que distribuía de forma
gratuita todos os anos presentes para as boas crianças.
Wobbuffet
era um desses adultos. Não porque ele era cético, mas porque não fazia sentido
mesmo.
Perdido
em pensamentos, ele observava o corpo da Jynx congelada pela vidraça da
enfermaria. Diversas suposições e teorias se passavam pela sua cabeça, mas todas
chegavam a uma mesma conclusão: Não fazia sentido.
—
Mas e se Papai Noel realmente existir? Não vai ficar mais fácil?
Pichu
olhava Wobbuffet e, vez em quando, tossia ao inalar a fumaça do charuto.
—
Garoto, eu acho que você deveria ser um pouco mais realista. Pensar na hipótese
da existência de Papai Noel é algo que não faz sentido nenhum.
— Ao
mesmo tempo que faz!
— Tch.
Tolice.
— Às
vezes, não é porque nós não enxergamos que não exista, titio. A Equipe de
Resgate dos Corações de Ouro sabe disso. Um bom detetive não enxerga apenas com
os olhos.
Wobbuffet
encarou o pequeno com desdém.
— Eu
acredito que o Poder da Amizade ainda vai deixar você em apuros um dia.
—
Mas ele tem razão. E você deveria saber disso.
Pichu
e Wobbuffet olharam para trás e viram o delegado Arcanine e o policial Graveler
se aproximando.
—
Desdenhar de fatos nunca lhe fará um grande detetive, Wobbuffet. Você tem
potencial, mas não consegue enxergar isso em você mesmo.
Wobbuffet
voltou a encarar a vidraçaria.
— Um
detetive chega à resolução de um crime analisando os fatos palatáveis,
concretos. Contos infantis estão bem longe disso.
Pichu
ficou em silêncio por alguns segundos antes de voltar a dirigir à palavra ao
Wobbuffet carrancudo.
—
Tio, você é um Pokémon que fuma e quer se tornar um detetive. Que tipo de
veracidade tem isso?
—Hahahaha,
é um excelente ponto! —Graveler gargalhou. — Complementaria dizendo que é
patético.
Arcanine
o repreendeu com o olhar. Graveler imediatamente calou-se. Wobbuffet escondeu o
rosto com a aba do chapéu.
—
Filho, peço-lhe licença. Agora, os adultos precisam conversar — Arcanine
dirigiu-se educadamente à Pichu, que concordou com a cabeça e afastou-se do
trio.
— O
que se passa? — questionou Wobbuffet, olhando para Arcanine.
—
Por que esse garoto está lhe seguindo?
Wobbuffet
hesitou por alguns segundos antes de responder.
—
Acredito que ele seja uma testemunha importante para descobrir o que aconteceu
com a Jynx encontrada congelada. Afinal, ele e os amigos foram os responsáveis
por localizá-la, apesar de não saberem nada sobre como esse Pokémon foi parar
lá.
Graveler
novamente deu um ataque de riso.
— Eu
não sabia que agora você estava trabalhando de babá!
Mais
uma vez, o olhar mortal que Arcanine soltou em cima de Graveler o fez silenciar
imediatamente.
—
Olha chefe, vou lhe dizer uma coisa. Eu realmente acredito que esse garoto
tenha alguma coisa que possa nos levar a resolver esse caso, apesar de ser novo
e... Acreditar nessa coisa de Papai Noel. Só estou seguindo minha intuição.
Arcanine
suspirou.
—
Talvez o que você precise nesse momento não é seguir a sua intuição, é deixar
que a intuição dos outros determine o caminho que você deve percorrer.
— Eu
acho que você deveria me dar uma Chansey...
Uma
das enfermeiras Chansey que passava pelo corredor se dirigiu até o grupo, como
se tivesse sido convocada.
—
Sim, pois não, em que posso ajudar? Vocês vieram saber sobre o estado de saúde
dessa Pokémon? Eu não tenho boas notícias — comentou ela sorridente.
Graveler,
completamente sem graça, massageou a têmpora com a mão.
— Eu
devo ter colado chiclete no templo onde Arceus foi selado, não é possível...
***
Pichu
preocupou-se ao ver Wobbuffet com um olhar perdido voltar para a recepção da
enfermaria, onde ele o aguardava.
— E
então, tio, o que aconteceu?
O
detetive se sentou em uma das cadeiras próximas e acendeu outro charuto.
—Jynx
terá de ser descongelada aos poucos. Ela é um Pokémon de Gelo, não se pode usar
golpes como Ember ou Flamethrower, se não ela pode morrer no
processo.
Pichu
ergueu as sobrancelhas e paralisou.
—
Como assim, tio?! E agora?
—
Bem, agora será um processo que durará pelo menos mais três dias. O
derretimento terá de ser feito de forma lenta e gradual.
—
Mas a Jynx não é um dos Pokémon que auxilia o Papai Noel na entrega dos
presentes?
—
Sim, é. E o que tem?
Pichu
pareceu indignar-se pela obviedade e gravidade da situação não terem sido ainda
percebidas por Wobbuffet.
—
Tio, amanhã é 25 de Dezembro, dia de Natal. Papai Noel sumiu, a Jynx que o
auxilia está hospitalizada. Quem vai entregar os presentes ao redor do mundo?
Wobbuffet
refletiu por alguns instantes sobre aquilo que Pichu havia acabado de falar.
Riu em seguida.
— Hahaha,
pivete. Eu acho que é você que não está entendendo a gravidade da
situação aqui. O departamento está investigando o aparente “desaparecimento” de
um cara que não existe quando na verdade o que deve ser investigado é de onde
vem a Jynx e o motivo de ela ter sido congelada.
Pichu
fechou a cara.
—
Tio, presta atenção. Se o Natal não acontecer, se não tiver ceia, família
reunida e, principalmente, presente debaixo da árvore, pode acontecer um
desastre! Papai Noel existe, você que não raciocina direito!
Wobbuffet
olhou para o rosto de Pichu. Ele realmente ficava fofo quando enfezado.
—
Garoto, eu tenho muito trabalho pra fazer aqui. Vá para casa, tudo bem? Nos
falamos quando eu precisar de você.
O
detetive levantou-se e se dirigiu para o interior da enfermaria, provavelmente
retornando para o lado de fora do quarto onde Jynx permanecia internada e
congelada. Pichu, com lágrimas nos olhos, saiu correndo em direção à saída.
***
—
Vamos entregar os presentes de Natal esse ano!
Bulbasaur,
Magby e Psyduck olharam para Pichu, que ofegava na porta. Os integrantes da
Equipe de Resgate dos Corações de Ouro nunca haviam lidado antes com uma ideia
tão absurda.
—
Como assim, Pichu? — perguntou Bulbasaur.
— O
Papai Noel sumiu! Vamos entregar os presentes em seu lugar, pessoal! Só
precisamos da lista de endereços!
Magby
olhou para Pichu e franziu o cenho, confuso.
—
Mas pra isso, não precisaríamos ir até o Polo Norte? Afinal, é lá que o Papai
Noel mora e deve guardar esse tipo de coisa...
— Eu
não sei não... — hesitou Psyduck. — Onde fica o Polo Norte?
O
silêncio pairou na sala.
— É
verdade... Como a gente faz pra chegar lá? — questionou Bulbasaur.
Pichu
refletiu por alguns instantes.
— E
se a gente pedir ajuda pra algum Pokémon voador? Ele poderia nos levar até lá.
— Eu
não acho muito inteligente. Um Pokémon voador muito provavelmente não
conseguiria voar no frio do Ártico, a neve impediria suas asas de bater direito
— comentou Magby.
—
Pior também é saber que nenhum brinquedo que ganhamos tem o endereço de
remetente... Só tá escrito “Made in China", mas eu não acho que o
Polo Norte fique na China — comentou Psyduck. — Papai Noel nunca me pareceu
chinês.
—
Você é patético... — suspirou Magby em resposta.
— E
se nós tentássemos perguntar pra Jynx? — sugeriu Bulbasaur.
—
Ela está congelada ainda, vai demorar muito pra que ela possa dar alguma
pista... Por isso sugeri que a gente fosse entregar os presentes desse ano —
explicou Pichu.
—
Mas então como nós faremos para poder descobrir o endereço do Polo Norte? —
questionou Magby.
— Eu
acho que tenho uma ideia.
A
Equipe de Resgate dos Corações de Ouro olhou para trás e viu Wobbuffet na
porta.
— O
que você está fazendo aqui, tio? — perguntou Pichu.
— Me
redimindo. Eu acho que você pode ter razão. Amanhã é dia 25 de Dezembro, dia de
Natal. O que você falou, sobre catástrofes acontecerem... Tem um ponto de
verdade. O que eu não entendi ainda é porque ninguém parece se preocupar com
isso...
Pichu
o encarou curioso.
—
Como assim, tio?
Wobbuffet
retirou seu chapéu fedora e entrou na pequena cabana em que a Equipe de Resgate
dos Corações de Ouro fazia de Base Secreta e de morada. Dirigiu-se até a mesa
de madeira, puxou uma das cadeiras e sentou-se, repousando os cotovelos na
mesa, colocou um charuto na boca e o acendeu com o auxílio de um isqueiro,
usando as duas mãos para acendê-lo.
—
Nenhum Pokémon que a polícia interrogou parecer dar importância para o fato de
amanhã ser Natal — o detetive deu outra tragada profunda no charuto. — E isso é
o que mais me deixa intrigado.
—
Faz sentido... — comentou Bulbasaur.
Psyduck
pareceu refletir por alguns instantes.
—
Será que alguém quer acabar com o Natal?
Magby
deu um tapa no cocuruto da cabeça de Psyduck.
—
Não seja burro! Quem é que teria vontade de fazer algo assim?
— É
um excelente questionamento, Psyduck — disse Wobbuffet, para surpresa de Magby
que olhou o detetive completamente confuso.
— Tá
falando sério? — perguntou o Pokémon.
—
Com certeza. Existe louco pra tudo — respondeu Wobbuffet dando outra tragada no
charuto.
Magby
encarou Psyduck e permaneceu incrédulo.
—
Tio, você já tem alguma ideia de quem pode estar querendo boicotar o Natal? —
questionou Pichu.
Wobbuffet
deu uma última tragada e apagou a bituca na mesa de madeira. Bulbasaur franziu
o cenho ao ver a fina fumaça subindo de onde a mancha em forma de cicatriz
marcada na mesa ficaria.
— Eu
não sei quem é ainda. Mas eu tenho uma ideia de quem possa saber.
***
A
tarde já estava se transformando em crepúsculo quando a Equipe de Resgate dos
Corações de Ouro, acompanhados do Detetive Wobbuffet, chegaram à porta de
entrar de um estabelecimento visivelmente suspeito. As paredes já estavam com a
tinta descascada, onde os tijolos, podres, se exibiam nus. A enorme porta cinza
não tinha maçaneta, e era guardada por uma Granbull carrancuda que não parecia
ter muitos amigos. O beco estreito que dava para o local não tinha postes de
luz. A noite era um breu total, o que o fazia ser totalmente evitado por demais
Pokémon que passassem nas ruas paralelas. Aquele endereço só era frequentado
por aqueles que queriam estar ali.
Wobbuffet
se aproximou de Granbull.
—
Wobba... Eu jamais pensei que o veria novamente por aqui — a voz de Granbull
soou rouca e pesada.
—
Sabe como é, né? Às vezes precisamos relembrar de nossas raízes.
Granbull
olhou por cima do ombro do detetive e deu um sorrisinho debochado.
—
Desde quando você virou babá?
—
Digamos que na verdade eles são... Meus assistentes juniores.
—
Sei... Você deveria saber que a entrada deles é proibida, né? Apenas Pokémon a
partir da segunda forma evolutiva podem entrar aqui, sabe disso.
—
Sei. Acontece que eu estou aqui por medidas oficiais. Tenho um suspeito na mira
e ele pode estar aí dentro.
Granbull
o encarou com os grandes olhos enrugados e ergueu uma das sobrancelhas.
— E
como você pode ter tanta certeza de que seu suspeito está aqui?
—
Ora, Bull... Todo mundo está aqui,
não é?
Granbull
soltou uma risada rouca. Os Pokémon da Equipe de Resgate dos Corações de Ouro
deram um passo para trás, pegos de surpresa pela risada quase maligna da Pokémon.
—
Claro, claro. Você tem razão. Pode entrar — Granbull deu três violentos tapas
na porta de aço. — Abre aí, Fera!
Quando
a porta abriu, um imenso Feraligatr mal humorado apareceu. Seus olhos vermelhos
encararam os visitantes com rancor, num breve e bem dado recado de que eles não
eram bem-vindos naquele local.
— Eu
não sei o que todos vêm fazer aqui,
mas com certeza eles não são nada felizes... — cochichou Magby para Bulbasaur.
De
cabeça baixa, a Equipe de Resgate dos Corações de Ouro seguiram Wobbuffet, que
cumprimentou Feraligatr com um breve aceno de cabeça. Um arrepio percorreu o corpo
daqueles Pokémon quando, com ignorância, Fera fechou a porta, batendo-a com
violência.
As
paredes escuras do bar davam ênfase ao breu que fazia companhia aos Pokémon que
ali frequentavam. Uma densa nuvem de fumaça de algum Smokescreen de algum Pokémon espalhava-se pelo ambiente, tornando-o
sombrio. O barulho dos grunhidos e conversas dos Pokémon logo preencheram os
ouvidos dos recém-chegados, que sentiam um leve arrepio na espinha a cada passo
que davam para o interior do estabelecimento. Luzes a meia-luz davam um clima
até que romântico ao ambiente, cercado dos mais diversos tipos de Pokémon, dos
mais miúdos aos poderosos e fortes. Dos que dançavam em uma pista de dança
improvisada no centro do pequeno lugar, afastando as mesas e cadeiras e criando
um espaço circular quase perfeito, enquanto ouviam um Murkrow fazer seu show
aos carrancudos musculosos que não saíam de suas mesas no bar, sempre sendo
servidos por atraentes Miltank garçonetes que curiosamente trajavam pouca
roupa.
—
Por que essas Miltank tão quase peladas? — questionou Magby.
—
Olha esse lugar... Ainda não é óbvio? — Bulbasaur perguntou de volta.
O
Pokémon de fogo olhou ao redor e refletiu por alguns instantes antes de chegar
a uma conclusão.
—
Não — respondeu Magby.
Bulbasaur
deu um suspiro para demonstrar sua impaciência.
— É
entretenimento adulto. Adultos vivem com pouca roupa. Ou, pelo menos, vivem
tirando elas.
Psyduck
arregalou os olhos, espantado.
—
Por quê? Eles não trabalham? Deveriam ganhar dinheiro o bastante para comprarem
roupas que cubram seus corpos inteiros...
— A
maior diversão dos adultos só pode ser feita se eles estiverem sem roupas.
Wobbuffet,
Pichu, Magby e Psyduck olharam para Bulbasaur.
— E
qual seria essa diversão que só pode ser feita se eles estiverem sem roupas? —
questionou o detetive.
—
Tomar banho depois de um dia cansativo no trabalho, oras. Achou que fosse o
quê? — Bulbasaur não acreditou que um detetive tão inteligente quanto Wobbuffet
não soubesse daquela resposta tão óbvia.
O
detetive riu.
—
Desculpe pela minha ignorância, jovem.
— Tá
tudo bem. Nem todos podem ter a minha inteligência — disse Bulbasaur em um tom
convencido. — Mas bem, senhor... O que viemos fazer aqui mesmo? O senhor disse
praquela senhora que todos vêm aqui,
mas quem exatamente nós estamos
procurando?
Wobbuffet
apontou para o lado do local onde os Pokémon sentavam-se para beber.
Um
Pokémon sentava-se sozinho com uma taça de bebida à sua frente. Parecia
isolar-se de todos ao redor, apesar de, à primeira vista, essa ideia parecer
tosca. Afinal, para onde se olhasse, havia outros Pokémon ao redor.
O
detetive aproximou-se da mesa. O Pokémon, de costas para o grupo, não o viu
chegar.
— O
que o traz aqui, senhor Delibird? O último lugar que eu esperaria encontrar o
braço direito de Papai Noel seria este.
Delibird
olhou para trás e caiu da cadeira. A mesa em que o Pokémon estava virou e
derramou sua bebida no chão.
—
O-o que v-você q-quer comigo?! — exclamou o Pokémon.
—
Seu drinque derramou... É melhor Pidgeotto...
Um
garçom aproximou-se ao ouvir seu nome ser chamado.
—
Quer outro Martini, batido, não mexido, senhor? — ofereceu o Pidgeotto, já com
a bandeja na mão onde outra taça de vidro estava colocada.
Delibird
levantou-se correndo e derrubou o Pidgeotto garçom no chão. A movimentação
começou a chamar a atenção dos presentes, que olharam curiosos a confusão. O
Feraligatr que atuava como segurança apareceu pelos fundos e logo Wobbuffet
notou que, de demais cantos, surgiam Primeape e Machamp, de óculos escuros e
mal-encarados.
—
Equipe de Resgate, não o deixem fugir! — exclamou o detetive.
Pichu,
Bulbasaur, Psyduck e Magmar passavam com facilidade por debaixo de pernas e
patas dos Pokémon que ou tentavam pegá-los ou se atrapalhavam no meio da
confusão. Os pequenos tentavam não perder Delibird de vista, que pulava por
cima das mesas e tentava voar, mas sempre se atrapalhava devido aos enormes
lustres que iluminavam o local.
Os
seguranças avançaram para cima de Wobbuffet, que os repeliu utilizando o Counter, jogando os trogloditas para os
lados com violência. O detetive avançava com dificuldade tentando cercar
Delibird dando a volta no salão, espremendo-se entre outros Pokémon que aglomeravam-se
pelos cantos, curiosos, assistindo a toda confusão. Os Pokémon que faziam a
segurança logo recuperaram a consciência e levantaram-se, procurando Wobbuffet por
entre as cabeças espalhadas pelo local. O detetive se abaixou e orientou-se
pelos voos curtos que seu suspeito fazia.
— A
gente precisa dar um jeito de deter esse cara! — exclamou Pichu
— Me
deixa tentar uma coisinha... — pediu Bulbasaur mirando nas costas de Delibird.
Cipós
saíram do bulbo das costas do Pokémon de grama e agarraram Delibird pela
cintura, derrubando-o no chão. O Pokémon ergueu-se de joelhos e foi
engatinhando para a porta de saída de emergência próxima de onde estava.
Delibird
viu uma enorme sombra erguer-se sobre ele e parar na frente da porta, como se
quisesse impedir que fosse aberta. O Pokémon correu para tentar abri-la de
qualquer maneira, mas a sombra o repeliu e o arremessou para trás de forma
agressiva.
— Não
há pra onde fugir, Delibird. O Selo das Sombras* não vai deixar — Wobbuffet
aproximou-se e o encarou com um olhar mortal.
Feraligatr,
Machamp e Primeape logo alcançaram o grupo.
—
Não é aqui que vocês vão causar baderna! — exclamou Feraligatr, furioso.
—
Calma aí, jacaré. Eu sou da polícia, e é melhor você baixar o tom de voz —
Wobbuffet abriu o sobretudo e tirou um distintivo dourado de dentro dele. Os
seguranças se entreolharam e deram um passo para trás.
—
Não fui eu, eu juro... Não fui eu! — Delibird tremia da cabeça aos pés e suava
frio.
—
Ora... Mas eu nem falei o que eu queria com você... Do que está se defendendo?
— Wobbuffet apoiou um dos joelhos no chão e apoiou o braço na outra perna,
sorrindo de forma cínica. — Não tente mentir pra mim.
As
sirenes policiais podiam ser ouvidas do lado de dentro do clube. O clima de
tensão tomou conta do ambiente, mas Wobbuffet não pareceu se incomodar.
— E
agora, tio, o que faremos? — perguntou Pichu.
O
detetive levantou-se, mas não tirou os olhos de Delibird, que o encarava como
se o mesmo fosse algum espírito pronto para levá-lo aos confins do inferno.
—
Agora nós faremos justiça.
***
O
relógio no pulso de Wobbuffet batia dezoito horas e trinta e dois minutos. Apoiava
as duas mãos na mesa de madeira, iluminada por uma luminária redonda que
refletia nas paredes cinzentas. Da vidraça instalada na sala, apenas se podia
ver reflexos de quem estava presente, apesar de suspeitar-se de que outras
pessoas assistiam a tudo do outro lado da parede. Delibird encarava a mesa e
continuava tremendo. Apesar de todas as respostas do Pokémon, o detetive ainda
não estava satisfeito.
—
Você era o principal aliado de Papai Noel, certo? Papai Noel some. Você diz que
não sabe do paradeiro, é encontrado bebendo em um endereço barra-pesada e tenta
fugir quando me vê. Eu ainda não acredito na sua inocência.
Delibird
começou a gaguejar.
—
M-mas e-eu r-realmente n-não s-sei o-onde e-ele e-está...!
—
Você tem medo do Papai Noel?
Delibird
arregalou os olhos.
Na sala ao
lado, o delegado Arcanine, acompanhado de Graveler assistiam ao interrogatório.
— O que ele
está fazendo? — questionou Graveler.
— Eu não sei,
mas temos que esperar pra ver. O suspeito tem álibis muito bons, mas sei que
Wobbuffet deve ter algum truque na manga — respondeu Arcanine sem tirar o olho
do vidro.
— Acha mesmo
que o Wobbuffet pode estar certo?
— Acredite ou
não, mas... Ele tem potencial. Está tudo sob controle. E se alguma coisa sair
do controle, nós temos reforços.
Graveler
olhou para o delegado e deu um suspiro.
— Se o senhor
está dizendo... — e voltou sua atenção para o interrogatório.
Wobbuffet
encarava Delibird no fundo dos olhos, como se tentasse enxergar a alma do
Pokémon.
— Tem cinco
minutos que eu perguntei e você ainda não respondeu, só gagueja. Então, eu vou
perguntar de novo: Você tem medo do Papai Noel?
Delibird
hesitou por alguns segundos. Sem olhar diretamente para Wobbuffet, encarou a
mesa a sua frente, até fechar os olhos e respirar fundo.
— Papai Noel
não é uma pessoa “adorável”. Ele não é nem um pouco a figura bondosa que todos
pensam ser.
Wobbuffet
ergueu a sobrancelha direita.
— Hmmm... E
por quê?
— Não ficou
claro ainda o porquê ninguém parece se importar com o sumiço dele, senhor
detetive? É que ninguém se importa. Eu mesmo sou o responsável direto por assessorar
o Nicolau e tem alguns anos que ele vem dizendo que iria se aposentar, na mesma
época, inclusive, que ele começou a tratar mal seus funcionários. Devia estar
de saco cheio – e isso não é uma piada — Delibird encarou Wobbuffet pela
primeira vez.
O detetive colocou
as duas mãos nos bolsos do sobretudo e deu uma última encarada para o Pokémon à
sua frente.
— Eu nunca
disse que era uma piada — e virou-se em direção à porta que dava para a saída
da sala de interrogatório.
*Nota:
Selo das Sombras se refere à Ability Shadow Tag